Bem sei que sou suspeito, mas lá vai…
A terceira conferencia sobre a «reforma do sistema eleitoral» por nós organizada foi, até agora, de longe, a que maior risco acartava.
A terceira conferencia sobre a «reforma do sistema eleitoral» por nós organizada foi, até agora, de longe, a que maior risco acartava.
Em primeiro lugar pelo tema ser demasiado específico para que possa alcançar um vasto público (sejamos honestos, já não é fácil encontrar quem se interesse pela temática dos sistemas eleitorais - e por acaso, até temos tido algumas surpresas…). Em segundo lugar, quando esses temas são apresentados de um ponto de vista histórico, comparativo e académico. Em terceiro, no painel não se encontrava nenhuma super vedeta académica, política ou afim. Desta vez não contávamos com deputados ou membros do governo. Valorizámos a experiência da Zília Osório de Castro, a irreverência do Zé Castilho e a pertinência do Pedro Alves (é claro que não me aprecio…). Por fim, a divulgação não foi o que poderia ter sido, em virtude de não querermos confundir o nosso potencial público com demasiada informação – em virtude do começo do nosso ciclo sobre o 25 de Novembro começar na segunda-feira, dia 7 de Novembro.
Portanto, com todas estas condicionantes, fomos positivamente surpreendidos por uma sala muito bem composta, onde proliferavam caras novas, académicos e historiadores, professores e estudantes universitários, alguns amigos e também alguns habitues (sim, que já os vamos tendo).
O painel, que teve uma desistência de ultima hora (o Paulo Fernandes, que nos iria falar sobre a Regeneração – prometeu redimir-se em breve…), e foi muito bem conduzido pelo Diogo Moreira – que me cortou o pio por varias vezes -, contou com três brilhantes exposições. A da Zília Osório de Castro, versando o vintismo, debruçou-se sobre a complexidade da construção dos primeiros textos de legislação eleitoral, as suas influências e os conflitos em causa. Ficámos a saber que as cortes constituintes de 1822 beberam da experiência espanhola de Cadiz (constituição de 1822); que as leis eleitorais elaboradas eram bastantes «modernas», prevendo uma universalidade, à época, pouco normal.
Já o José Tavares Castilho, debruçando-se sobre a I República, valorizou os aspectos políticos e sistémicos que impossibilitaram que o apregoado voto universal (pelos membros do Partido Republicano ao tempo da Monarquia) nunca tivesse sido interpretado em algum decreto legislativos. Para esse efeito socorreu-se na (não) atribuição de direitos políticos às mulheres e aos analfabetos, na personagem de Afonso Costa e nas leis-chave da I República (separação do Estado da Igreja, lei do Divórcio, leis eleitorais) para tecer um argumento simples: a República estava em Lisboa e no Porto. O Partido Republicano, evoluído no Partido Democrático, e dominado por Afonso Costa, via com pouco interesse o alargamento do voto às mulheres e aos iletrados (maioritariamente no campo), pois podia – e talvez com alguma razão – perder rapidamente eleições e o acesso ao poder. Assim, e para melhor poder erguer o seu programa radical, limitou o acesso ao voto, perpetuando-se assim no Governo.
Por fim, o Pedro Alves, reclamando com as «sobras» que lhe tinham sido atribuídas, munido de uma oratória excepcional, aventurou-se nas origens do sistema eleitoral do pós-25 de Abril, numa perspectiva dinâmica, fresca e inovadora. Atacou a designação de III República com que foi denominada a nossa contemporaneidade e deambulando pelas diversas propostas existentes hoje (algumas delas já retratadas em iniciativas passadas do clube), apresentou uma defesa forte do sistema actual.
Sobre o outro conferencista, não opino.
O público, inexplicavelmente inerte, desafiou pouco a mesa. Esta, não se importando, respondeu com animadas picardias entre os elementos do painel.
Em suma, uma noite bem passada. Talvez não tão intensa – e lembro-me da do Vasco Rato – e não tão mediatizada como outras. Mas, como aqui já referimos, interessa-nos vários registos. Interessa-nos várias dimensões de análise. Interessa-nos propor pontes entre públicos, temas e actores. Interessa-nos mesclar política com sociedade com cultura. E isso aconteceu, na quinta-feira.
E é com orgulho que vejo este projecto crescer.
Obrigado.
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