quinta-feira, junho 30, 2005

Agora sim, foi de vez

Morreu o século XX português!

Após as recentes perdas de três vultos da História Contemporânea portuguesa (um epifenonomo, Vasco Gonçalves; um poeta intemporal, Eugénio de Andrade; e um combatente legendário, Álvaro Cunhal), eis que morre quem, para todos os outros, era, há muito, a cronologia viva do século XX português. Deixa-nos aos 105 anos.

Para entendermos a importância e a vida de Emídio Guerreiro, basta termos a noção que ele não só tem lembranças, de miúdo, da queda da Monarquia, como participou activamente no chamado «reviralho» (nos anos 20), foi exilado, combatente na Guerra Civil Espanhola (do lado republicano, obvio), resistente antifascista e, já com 70 anos, fundador do PPD (em 1974), deputado à constituinte e líder do PPD (por doença de Sá Carneiro no Inverno de 1974).

Uma arvore, daquelas que se assumem como manual de historia viva. Uma sapiência que se perde, que transforma o presente mais pobre, que escurece o panorama cultural e político de um país.

Uma qualquer imposição do destino parece ter aparecido. As fatias de História recentemente desaparecidas tornam o bolo da modernidade mais visível, escasso e estranho. Já cá não estão? Mas ainda cá estavam? Confundem-se as memórias. Afunda-se o passado. Projecta-se o futuro. Esquece-se o presente.

Está a mudar, a estação. Morre, desdenhando aos poucos, o nosso século XX. Já nos habituámos a ler nos compêndios. Esquecemos os que ainda por cá estão.

Adeus homem bom. Que pena tive de não te ter conhecido (e até tinha planeado entrevistar-te…).

Agora escrevam, leiam, estudem.

Já poucos existem que nos contem histórias. Que os lembrem.

Vemo-nos em breve Emídio.

quarta-feira, junho 29, 2005

O IGLÔ MORAL DO SR. NEVES, ou como se mandam os homossexuais para a gafaria e as mulheres para o gineceu

Mulheres sede submissas aos vossos maridos, como convém ao Senhor.

S.Paulo, Carta aos Colossenses

Nem imorais, nem idólatras, nem adúlteros, nem efeminados, nem sodomitas (...) possuirão o Reino de Deus.

S.Paulo, 1ª Carta aos Coríntios

Ontem, dia 27 de Junho, ao folhear o Diário de Notícias, deparei-me com um artigo de João César das Neves intitulado “A liberdade que mata a liberdade”, frase que logo me chamou a atenção por dela tresandar um cheiro a um certo conservadorismo que por este país se vai espraiando, sempre na tentativa de demonstrar que a verdadeira liberdade está em não ter nenhuma.
Ao iniciar a minha leitura do texto não me enganei. Quando cheguei ao fim sentia que o encadeamento das palavras era como que um arame farpado lançado para nos prender a todos numa moral supostamente universal. Num estilo moralista, a roçar o puritanismo, o sr. Neves espalha uma doutrina ultra-conservadora sobre a família e os costumes sexuais muito semelhante aos ensinamentos de S. Paulo – porventura o grande primeiro deturpador daquilo que seria a mensagem original de Jesus Cristo –, enquanto suspira pelos tempos em que o ideal de família vinha estampado nos postais do Império Britânico: a rainha Vitória e o príncipe Alberto rodeados da sua numerosa prol.
Antes de começar a desconstruir o iglô moral em que o sr. Neves nos quer enfiar a todos, convém dizer que toda a sua argumentação assenta no princípio de que todas as pessoas são cristãs ou, pelo menos católicas. Diria melhor: que todas as pessoas, cristãs ou não, se regem pela moral cristã tal como as suas igrejas a transmitem. Se partirmos do princípio que as opções religiosas são algo que pertence ao foro íntimo de cada um, algo de privado, qualquer tipo de moral que esteja no seu âmago também o é. Logo, o sr. Neves não pode querer que os valores em que acredita sejam partilhados por toda a sociedade, que é composta por indivíduos com diferentes convicções neste campo.Com isto não quero dizer que todos os valores são relativos (talvez até o sejam na sua essência na medida em que foram inventados pelo próprio Homem, mas na prática não o podem ser, pois a vida em sociedade tornar-se-ia impossível). Quero, sim, dizer que existem alguns que têm necessariamente de ser absolutos, mas outros não, podem variar e é preciso respeitar isso. Existem ainda alguns que são praticamente universais, mas que são interpretados de forma diversa.
Escolhi quatro excertos-chave do artigo para denunciar o reaccionarismo de costumes que por lá se passeia completamente impune:

1 º- “Enfraqueceu-se o matrimónio pelo divórcio e as uniões de facto”.
Bem, talvez o sr. Neves preferisse que não houvesse direito ao divórcio e assim sim, teríamos casamentos fortes que durariam 50 ou mais anos, mesmo que os cônjuges já não se amassem, mesmo que o marido espancasse a mulher sempre que o Benfica perdesse, mesmo que toda a sua relação fosse já um absurdo. Assim sim! Assim teríamos matrimónios fortes como o aço, embora vazios de significado.
É para isto que o divórcio serve, sr. Neves...Para evitar que as pessoas sofram mais e para que possam prosseguir na sua procura pela felicidade sem terem que esperar que o estranho que dorme ao seu lado na cama morra. É possível que a penitência seja um sacramento que lhe agrade, mas isto é ridículo!

2º - Logo a seguir à frase anterior: “Agora pretende-se descaracterizá-lo com o casamento de homossexuais. Qualquer aliança entre duas pessoas passaria a ser considerável como casamento”.
Primeiro de tudo, um matrimónio que se realize sem qualquer tipo de motivação religiosa, ou seja, um casamento pelo registo civil, é um mero casamento com o Estado. Cada vez mais, as pessoas estão a aperceber-se que, quando se ama verdadeiramente, não é necessário assinar uns quantos papéis e aguentar um fotógrafo e cento e cinquenta convidados bêbados durante um dia inteiro. Basta amar. Quem ainda se casa pelo registo, fá-lo pelos benefícios que daí advêm.
Porém, todos os cidadãos devem ter o direito a casar-se seja com quem for, pelo menos no registo civil. Penso que esta mudança não estará muito longe de se efectuar. Como quem casa pelo civil não é religioso, a questão da homossexualidade não se põe. Quanto à Igreja Católica, o sr. Neves que não se preocupe, pois não me parece que esta cometa o crime de evoluir neste aspecto. Neste campo, a situação é mais dramática para quem teve a infelicidade de ser homossexual e católico. Os representantes do seu Deus na Terra acham, simplesmente, que por causa de uns textos que S. Paulo e outras pessoas escreveram há centenas de anos, quem tem opções sexuais diferentes da maioria, não merece realizar o sonho de se casar.

3º - De forma irónica (e talvez invejosa, digo eu baixinho...) diz: “Mas no campo sexual a única regra admissível é fazer-se o que se quer, sem ninguém ter nada com isso.”
Uff!! Ainda bem que me confirma isso! Começava a ficar preocupado se assim não fosse. De facto, sexo é como a comida que comemos, os livros que lemos, os filmes que vemos, a música que ouvimos, os amigos que temos, os desportos que praticamos: é um prazer, é legal, não faz mal à saúde e, por isso, mais ninguém tem a ver com o assunto.

4º - “A mulher é sempre a grande sacrificada. Vivemos no tempo que mais a agride, despreza e oprime. O facto passa despercebido porque, paradoxalmente, tudo é feito em nome da sua libertação. Este magno embuste cultural é já o segundo da nossa era. O feminismo radical é paralelo ao marxismo, que destruiu a condição dos trabalhadores em nome da defesa dos seus interesses.
A opressão actual da condição feminina é fácil de demonstrar. Quais as principais vítimas da degradação da família? Da liberalização do aborto? Da banalização da pornografia?”. (...) No campo sexual a agressão é mais cínica. Vemos há décadas um esforço intenso para mascarar como natural um modo de vida promíscuo, hedonista, descomprometido. Esta filosofia nada tem de moderno. Ou feminino.” O autor acaba por dizer que a libertação da mulher a nível sexual favorece o machismo...: “A “mulher desinibida” é a realização do sonho mais machista de Casanova e Don Juan, em nome da paradoxal “libertação da mulher
”.”

Neste caso, o sr. Neves tenta inverter o problema: tenta condenar a libertação da mulher afirmando que essa libertação é ilusória e que acaba por levá-la a uma maior opressão, pois isso supostamente tornava-a uma presa fácil para o homem, esse perigoso predador sexual (qual história do Capuchinho Vermelho e do Lobo Mau). Esta é uma desculpa para o autor do artigo defender um regresso da mulher ao lugar tradicional que a cultura judaico-cristã definiu à séculos atrás e que vigorou, de forma geral, no Ocidente até aos anos 60 do século XX.
Pelo contrário, a libertação da mulher é a melhor maneira de esta ser vítima de aplicações práticas de concepções retrógradas como esta, através do direito ao divórcio, ao aborto quando não tem condições económicas de ter um filho, a usufruir do seu corpo como muito bem entender, etc. Não favorece o machismo, mas evita-o. Uma mulher livre tem as armas de que precisa para se defender de abusos machistas. Uma mulher livre pode fazer um aborto e evitar que uma família estável economicamente, deixe de o ser, por ser obrigada a ter uma criança que não pode suportar, algo que acaba por ser prejudicial a esta também. Uma mulher livre sofre tanto como o homem quando a família se degrada ou passa por um processo de divórcio e é tão capaz de voltar a recompor a sua vida como o homem (não voltemos ao antigo estigma da mulher sozinha, desprotegida...).
A procura do prazer é um instinto básico, tanto no homem como na mulher. Caso o sr. Neves não saiba, as mulheres têm um apetite sexual igual ou superior ao dos homens – embora concorde que se possa expressar de uma forma algo diferente – e isso é sabido cientificamente pelo menos desde Freud. Se houve algo que este desde logo aprendeu, através da orientação do fisiologista Charcot, foi que a repressão de emoções e de instintos sexuais levava ao histerismo nas mulheres oitocentistas e dessa observação, o austríaco tirou ilações importantes que o levariam a desenvolver a psicanálise e a sua teoria sobre a origem das neuroses.
De facto, como diz, esta filosofia nada tem de moderno. Já os gregos e os romanos a tinham e isso só demonstra pela milionésima vez o quão sábios eram neste e noutros campos. A inexistência do conceito de “pecado”, que os intérpretes do cristianismo colocaram às nossas costas, fazia com que aproveitassem ao máximo os prazeres da vida. Tudo aquilo que sabe bem e não faz mal, só pode ser bom.

Enfim, a máxima que resume este artigo só pode ser: “Gays para a gafaria e mulheres para o gineceu”.

E foi assim que descobri que S. Paulo escreve no Diário de Notícias, em pleno ano de 2005 A.D. (Anno Domini).

Ricardo Revez
28-6-2005

Maria de Belém

Maria de Belém dava, no último mês, praticamente um Case Study. Ao ser convidada para candidata à Câmara Municipal de Oeiras, depois das tão comentadas palavras de Jorge Coelho ao Expresso, decidiu ser a cabeça de lista à Assembleia Municipal de Lisboa. É caso para perguntar que condições é que não estavam reunidas para Maria de Belém ser candidata em Oeiras, mas que já estão agora para ser candidata à Assembleia Municipal em Lisboa? Será que as condições passavam pela Santa Casa da Misericórdia, ou seja, condições contrárias à Maria José Nogueira Pinto? E que as ditas condições desapareceram por ter sido preterida para o cargo?

Se assim foi, o lugar oferecido na Assembleia Municipal de Lisboa veio mesmo a calhar! Não se livra da crítica dentro do partido, mas ao se "sacrificar" em prol do mesmo, de certeza que vai ser criticada, mas muito baixinho...

P.S. - Post também publicado no Esquerdices.

O Partido e o Candidato

Tenho seguido com alguma atenção os desenvolvimentos em relação à candidatura de Manuel Maria Carrilho a Lisboa e as suas picardias com a Concelhia do PS e com o seu presidente, Miguel Coelho.

É verdade que o Miguel nunca quis Carrilho como candidato. Nunca o controlou, e nunca o controlará (o mesmo, diga-se, já tinha acontecido com a candidatura do João Soares). Mais, com as características de Lisboa, adivinho mesmo que nunca um candidato terá o aval do presidente da Concelhia, que, por contraponto, terá sempre um candidato fora do seu raio de influência, de domínio e com potencial conflituante forte.

Também é verdade que o Miguel Coelho sempre procurou condicionar os candidatos a Lisboa; e era evidente, desde há pelo menos um ano, que não contava com Carrilho. De outra forma não se entende a necessidade abrupta com que lançava nomes atrás de nomes para a praça pública (Ferro, Mega Ferreira, etc.). Os problemas foram, entre outros, a questão do acesso ao candidato, o controlo da lista da vereação e o comando das questões de campanha.

Já Carrilho, movido de uma vontade pessoal férrea, encarou o desafio Lisboa com um espírito de missão e com a ideia de se transformar num Delanoe à portuguesa. Afinal já fora Jack Lang. Não é gay, mas tem uma mulher capa de revista e um filho vedeta de televisão…

Findos os apartes, desde cedo que Carrilho deu a entender que este era um projecto muito seu, assumindo-se, publicamente aliás, como «o homem por trás do projecto». Nesta sua caminhada pessoal cedo as relações com o partido se deterioraram, mais ainda quando as primeiras reacções da campanha foram tudo menos positivas (a questão do vídeo de campanha, o uso do filho, as entrevistas ocas e mal dirigidas, etc.). É verdade que Carrilho tomou para si toda a direcção do processo, tornando-se inacessível, não só ao contacto e à possível manipulação como, essencialmente, ao concelho e à entreajuda requerida e necessária entre candidato e partido.

Do alto da sua fortaleza, rodeado pelos seus indefectíveis, auto-excluindo-se dos processos partidários, Carrilho carrega, a sós, a candidatura. É verdade que é ele o principal visado, é verdade também que a eleição ao cargo a que concorre é uma eleição quasi-uninominal (no sentido em que é a lista para a vereaçao mas é o presidente que dá a cara e recolhe grande parte do voto), mas também é verdade que é o partido que é votado quer para a vereação, quer para a Assembleia Municipal quer para as Juntas de Freguesia. Nestas eleições, jogam os candidatos, mas também os partidos.

Não pode Carrilho pensar que está sozinho. Nem pode Miguel Coelho pensar que é candidato.

Importa descingir quais devem ser as funções e atribuições do candidato, da concelhia e do seu presidente, e mesmo do partido ao nível nacional. Quem deve fazer as equipes? E as listas? E dirigir a campanha? Quem manda? Estas são as questões na mesa.

Neste arrufo, questiono: Quem tem o pau? E quem tem a cenoura?

JRS

segunda-feira, junho 27, 2005

A Babilónia é grande…

Todos se identificam com os princípios regentes do partido… Todos se identificam com a sua ideologia e história, todavia quando os interesses instalados se confrontam com os grupos de pressão externos ou de facções divergentes, vulgo lobies, ou alguém que na sua pura ingenuidade tenta avocar a si uma ideia e não pertence a nenhum deles, está metido numa grande confusão.

Esta é a leitura que faço de episódios a que tenho assistido em comissões politicas, em congressos, em todo e qualquer local em que haja discussão, não de projectos ou de moções, mas os tão apregoados “lugares”… Já não sei se os mesmos são ocupados por protagonistas com mérito ou se por energúmenos seres empurrados por uns quantos medíocres… Para vos ser franco já houve alturas em que me senti medíocre!

Ser de esquerda ou não ser, é a grande equação de alguns socialistas que procuram uma boa desculpa para continuarem a dizer-se de Esquerda. Quando a situação normal e perfeitamente admissível seria alguém questionar-se por querer comparar se os princípios estariam a ser aplicados ou não, esses socialistas procuram incessantemente não essa razão, mas uma resposta que lhes dê “credibilidade” para o protagonismo assumido. Algo que justifique o continuar de cacique.

O ser de esquerda para esses “socialistas” implica conotações que infelizmente parece envergonha-los, e tendo estes um papel importante no educar de outros socialistas, os chamados de base, que se apresentam ao “trabalho” por amor à camisola, provocam nesse educar um constante desmotivar e dúvida aos militantes de base. Com isto o círculo começa a fechar-se.
Pretendo com isto dizer que depois só os CACICADOS se apresentam à discussão de ideias. Só os viciados pelo círculo aparecem, e depois as ideias, os projectos, as moções, tornam-se tristes sem sentido ou convicção. O Energúmeno tem de justificar ou pelo menos tentar justificar o lugar para o qual se candidata… e assim continuamos desprovidos de princípios ou moral…

Algumas atitudes destes supostos socialistas deixam-me esmorecido no meu continuar de luta, no meu acreditar em contribuir o melhor possível para a sociedade que me rodeia, para a comunidade que me acolhe…
Muito me fazem pensar para onde caminhamos!

Vou continuar a acreditar que as pessoas têm bons pensamentos, bons princípios…

PD

domingo, junho 26, 2005

fim de semana

Que dizer da dupla Coelho / Carrilho?

Onde anda a cenoura e onde está o pau…

(a voltar à carga, com tempo, disponibilidade e armas)

JRS

«escolhas de regime»

«Se estivesse no poder repatriava todos os emigrantes, instituía a pena de morte para os traficantes de droga, mantinha a lei contra o aborto, incentivava a natalidade, a educação e a saúde eram gratuitas e tornava ilegais grupos subversivos como a Maçonaria, PCP, PS, PSD, BE, SOS Racismo, Opus Dei, Ilga e Opus Gay».
Mário Machado, líder skinhead que integrou a manifestação em Lisboa, em declarações ao jornal Público, a 19 de Junho de 2005, retiradas do Expresso de 25 de Junho de 2005.

Ainda bem que alguém se safa, nesta verdadeira chacina democrática.

Não é? (não entendo se estao em construçao ou em reconstruçao, melhor perguntar a quem saiba e entenda do assunto)
JRS

sexta-feira, junho 24, 2005

Sobre o Luto Nacional

No Público de ontem (23/06/2005), aparecem num artigo assinado, declarações do Ministro dos Assuntos Parlamentares, Augusto Santos Silva, a "justificar" o porquê de não ter sido declarado Luto Nacional aquando da morte de Vasco Gonçalves em 12/06/2005, apesar do PCP ter apresentado um requerimento nesse sentido (fonte: Público).

Nas palavras do Ministro, Vasco Gonçalves foi apenas Primeiro-Ministro de Governos Provisórios e não Constitucionais, e a concessão do Luto Nacional teria sido já utilizada em demasia, sendo que chega a defender legislação para o Luto Nacional, que clarifique quais as razões que levam à sua declaração.

Ambos os argumentos são incompreensíveis!

O período de 1974-76, vigência dos Governos Provisórios, foi a fundação da nossa democracia e do nosso Estado social. Portugal deve mais aos homens e mulheres que governaram durante esse período, do que a qualquer Governo Constitucional.

O segundo argumento, claramente uma ilusão à concessão de Luto Nacional pela morte da vidente Lúcia, é também miserável. A concessão de Luto Nacional depende do mérito absoluto e não do mérito relativo da pessoa em causa. Ou alguém merece que seja declarada Luto Nacional no seu falecimento, ou não merece.

Se Mário Soares e Sá Carneiro tivessem falecido no mesmo dia, iríamos negar o Luto Nacional a um, só porque morreu o outro?

Vocês dirão que isto é tudo "fumaça", e que a verdadeira razão porque Vasco Gonçalves não teve direito a Luto Nacional foi por causa do PREC e do"gonçalvismo". A minha resposta a isso é o caso de Álvaro Cunhal, que teve Luto Nacional, com um papel muito mais importante no "verão quente" de 75. Quem atirar a primeira pedra...

Vasco Gonçalves foi o Primeiro-Ministro do 13º mês, das reformas e pensões extensíveis ao povo em geral, e se temos um sistema de segurança social, a ele o devemos. Só por isso, Vasco Gonçalves merecia a concessão de Luto Nacional. Se consideramos que os aspectos negativos do PREC ultrapassam os seus benefícios, então Cunhal também o não merecia.

Sem falar no caso de Eugénio de Andrade. Embora não conheça a sua obra, toda a gente parece afirmar que ele foi um dos maiores poetas portugueses do Séc XX. Que eu saiba, grandes poetas não nascem (ou morrem) a toda a hora. E se Carlos Paredes teve direito...

Mas o verdadeiro aspecto trágico-cómico desta história, é que a concessão do Luto Nacional representa nada mais do que colocar a Bandeira Nacional a meia-haste, não havendo por isso qualquer custo para o Estado.

É uma vergonha que este governo, mais uma vez, tenha negado as suas raízes ideológicas. Ao negar o Luto Nacional, tenta-se apagar a imagem histórica de Vasco Gonçalves, dando assim mais munição legítima a quem quer dividir a esquerda. E a direita ri...

Para referência, cá vai um apontamento jurídico sobre o Luto Nacional:

Parecer da Procuradoria-Geral da República

1 - Ao decretar luto nacional, o Governo pretende, por esse meio e no apelo a regras de cortesia tradicionalmente praticadas e aceites, manifestar o pesar sentido pelo falecimento de cidadãos, ou cidadãos, nacionais ou estrangeiros, que, pelo seu perfil e (ou) a sua projecção, se entenda deverem receber essa homenagem dos Portugueses; (...)

3 - Não se encontrando codificadas as manifestações de luto, é uso içar a meia haste a Bandeira Nacional, simbolo nacional constitucionalmente reconhecido, exprimindo a vontade colectiva de um Povo (...)

quinta-feira, junho 23, 2005

Memória futura

Sobre Direita e Esquerda
Eu entendo que tenhas de defender essa tua «dama», esse grande marechal da democracia. Mas não achas que escolhes uma figura, que como cunhal, requer esquecimento? Ou seja, não é alguém que seja valida como um todo; vangloria-la apenas é possível apagando, deliberadamente como o fazes, parte importante da sua história.

Em relação à necessidade da direita encontrar «heróis em Abril», partilho da tua opinião que o Ideal de Abril, sendo universalista e utópico, não cabe em nenhum cabaz político ou ideológico. Dito isto, é também é verdade que o país político da época (e mais acentuadamente no PREC) vira, assumidamente, à esquerda, criando aí os seus heróis, os seus mitos, as suas Histórias.

Isto quer dizer que coube à esquerda a «responsabilidade» de iniciar o processo de redacção enciclopédica, ou seja, é ela que se assume como portadora da verdade histórica, é ela que cria os manuais, é ela que retoca os retratos gastos dos protagonistas. Tal posição, assumida aliás, incorre no risco de algum sectarismo, de certo revisionismo e de cirúrgico favoritismo de personagens especialmente bem fadadas para a «boa memória». A direita tem em Churchill um excelente exemplo do que afirmo...

Assim, é normal que a direita portuguesa não se sinta representada na historiografia contemporânea portuguesa. Cabe-lhe a ela (à direita) procurar o seu espaço e accionar os seus mecanismos revisionistas próprios. É esse aliás o papel que muitos senhores andam a fazer (Rui Ramos, Vasco Rato, Nogueira Pinto, Adelino Maltez, etc.).

A questão põe-se é se a direita, no processo de revisão histórica que refiro, não incorre, ela mesma, nos mesmos erros metodológicos que critica.

A meu ver, a direita actual, que se preocupa em criar e defender a sua existência numa memória colectiva que não a representa (a tal memória escrita pela esquerda), não só assume os mesmos erros sectários que critica a certa esquerda, como procura assumir o controlo da História, num processo revisionista puro, regado com sectarismos autistas e discrepâncias cientificas e metodológicas aberrantes.

(como é possível criticar Cunhal por lhe ser erguida uma «estátua opinativa» e levantar a memória de Spínola como um grande democrata «indispensável na liderança militar no golpe de estado que acabou com a ditadura»).

Também não sou daqueles que diz que a democracia portuguesa existe devido ao Cunhal. A realidade é muito mais complexa que a ficção.

Termino por aqui, espero continuar esta polémica, Pedro, se quiseres.

Por agora sugiro alguns heróis da direita abrileira (alguns já o são…): Adelino Amaro da Costa, Francisco Lucas Pires, Magalhães Mota, Barbosa de Melo, Emídio Guerreiro, Jorge Miranda, Sá Carneiro (a custo…), etc

JRS

terça-feira, junho 21, 2005

Diário de um Federalista de Esquerda

«A minha posição é a de um "federalista de esquerda". Portanto, tudo o que concorre para reforçar a integração política da União Europeia, isto é, tudo o que concorre, mesmo que só gradual e parcialmente, para o federalismo europeu, sou a favor.»

Manuel Villaverde Cabral- Sociólogo in http://bde.weblog.com.pt/arquivo/111204

«Façamos um debate não sobre quem está mais a favor da Europa, mas sim de que tipo da Europa.»

Tony Blair- Primeiro-Ministro do Reino Unido

O problema reside no tipo de Europa que Tony Blair quer impingir a todos os outros países. Não tenhamos ilusões. Blair quer impor a sua visão neo-liberal e destruir o modelo social europeu, que ele considera como o principal obstáculo a uma Europa mais competitiva e económicamente mais forte.

E tem razão.

Porque o neo-liberalismo é sem dúvida uma doutrina capaz de produzir grande crescimento económico e competitividade, como todas as variantes do capitalismo selvagem. Quando o próprio Reino Unido teve a sua Revolução Industrial (sécs XVII/XVIII), conheceu níveis até então inimagináveis de crescimento económico e de prosperidade.

À custa de inigualável exploração das classes desfavorecidas.

Hoje, é comum todos os partidos de centro-esquerda negarem as suas raizes marxistas e esquecerem os principios keneysianos. O PS não é excepção. Obscurecemos a grande importância de Marx para a definição do último resultado do capitalismo sem regras: um cada vez maior abismo entre ricos e pobres, e sobretudo a uma cada maior concentração de riqueza e poder nas elites económicas.

Keynes demonstrou que era com o papel interventor do Estado na economia e na sociedade que se poderia contrariar esta tendência. Os Estados-Previdência em geral, e o Modelo Social Europeu em particular, são baseados no conceito que cabe ao Estado garantir a igualdade de oportunidades no campo económico e social para todas as pessoas, baseado em serviços públicos de qualidade, que permitam que não seja a descriminação em termos de riqueza que resulte em que, por exemplo, apenas os ricos sejam educados ou tenham saúde.

Porque a "mão invisível" de Adam Smith destroi facilmente todos aqueles que não possuam vantagens competitivas, e aqueles que não tem os recursos económicos para virem de escolas caríssimas, que não possuam médicos privados e não tenham fundos de investimento para reforma.

Apenas um Estado forte com serviços públicos de qualidade pode assegurar que pessoas que provenham de famílias de baixos recursos possam competir, não em pé de igualdade, mas com hipótese de sobreviver, com aqueles que nasceram em famílias de grandes recursos.

Como Federalista de Esquerda lutarei para criar um Estado Europeu que promova um sistema de educação, saúde e segurança social europeu, que permita fazer frente à globalização (um dos maiores erros da história da humanidade), e que permita reduzir o fosso entre ricos e pobres.

Como Federalista de Esquerda lutarei para impedir a criação a nível europeu do modelo neo-liberal, e para impedir a cada vez maior exploração das classes desfavorecidas.

Em suma, lutarei para que Blair falhe redondamente.

segunda-feira, junho 20, 2005

Falar-se de política, fazer-se a política…

Viram neste fim-de-semana o Expresso?

Ainda dizem que não há spin… (onde andas Paulo Gorjão… que só vês o que te interessa…)

Atentem na distinção entre as parangonas da 1ª página e os seus desenvolvimentos:

1. «PS empurra Maria José Nogueira Brito para Lisboa».
Poderíamos pensar que alguma táctica maquiavélica por parte do partido Socialista estaria em curso…mas apenas lhe será retirada a confiança política para que fique á frente da Santa Casa (situação, aliás, normal, como o comprova o ultimo tratamento à Dra. Maria Barroso Soares…). Anormal e fora da indelicadezas políticas geralmente associadas a estas posições (lembrem, mais uma vez a forma como a Dra. Maria Barroso foi tratada), é a generosa oferta do governo, através do seu Ministro da Saúde, para que a citada Maria José fosse engrossar a direcção do Hospital Santa Maria, em Lisboa. Como não aceitou, e se julgou com tempo para encabeçar a lista do PP à câmara da capital, «o PS empurrou-a para Lisboa».

2. «Manuel Maria Carrilho chama jornalistas de débeis mentais»
Aparte da péssima entrevista do nosso candidato (não sei quem é que anda a assessorar, mas depois daquela apresentação do CCB – a do papá - esta entrevista…), apresentada com um gigantesco “38.750 caracteres de projecto”, na verdade o que ele diz é que «algumas pessoas devem julgar os jornalistas como débeis mentais» (cito de cor), nunca se posicionando como autor dessas afirmações, nem predispondo a sua concordância. Assim, o que tão gravemente se assume na primeira página, deste semanário de referência (nas palavras do seu director), nem encontra correspondência no desenvolvimento.

Junto com estes dois exemplos flagrantes, encontramos a sondagem de maioria absoluta ao Rui Rio no Porto (onde o Francisco Assis ainda nem disse alguma coisa) e a esperada vitória do Fernando Seabra em Sintra (sobre o João Soares).

Sinceramente senhor arquitecto José António Saraiva, com este tipo serviços ainda se espanta por não ter levado nenhuma condecoração do 10 de Junho?...

Vamos ter uma bela campanha…

JRS

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