domingo, julho 24, 2005

Sapos II

Num post anterior tinha referido os sapos que alguns militantes partidários teriam de engolir nas próximas eleições autárquicas. Na base da situação descrita estava a relação da Concelhia do PS com o seu candidato, com os seus militantes e com a lista por si apresentada quer à vereação quer à Assembleia Municipal de Lisboa [AML]. Não era, nem é, meu interesse atacar as estruturas internas do Partido Socialista, nem de qualquer outro partido, para todos os efeitos. O meu interesse é procurar avançar algumas reflexões, teóricas e práticas, sobre o que é «o voto», hoje, em Portugal.

Uma vez que das reflexões promovidas pelo clube a sobre o «Sistema Eleitoral Português: que Reforma» mereceu, e merecerá, especial atenção (em Outubro continuaremos este ciclo com uma conferencia sobre «A evolução do sistema eleitoral em Portugal. do Vintismo aos nossos dias»), é natural que procure pensar um pouco do que é isso de votar…

Para mais, no Expresso deste fim-de-semana, a noticia sobre a campanha do CDS mereceu a minha atenção porque reforçou algumas preposições por mim avançadas anteriormente. Aparentemente, a lista à AML apresentada por Maria José Nogueira Pinto, em comissão politica concelhia, obteve 71 votos a favor e 20 abstenções contra os 92 votos recolhidos pela lista apresentada por Telmo Correia. Sem mais informações, e sem querer contribuir para o debate CDS versus PP, aparentemente a lista apresentada pela candidata foi chumbada. Se será a lista de Telmo Correia a apresentada a sufrágio, não sei. Imagino, isso sim, que será possível que se encontrem pontes comuns e se acorde algo. Afinal, se Telmo se armar em Miguel, é bem provável que obtenha o que desejar… (novas informações dizem-me que as listas apresentads foram para a vereação - Maria José Nogueira Pinto - e para a AML - Telmo Correia. obrigado Diogo B. Henriques)

Mas o argumento não decorre do que as démarches necessárias e esperadas dos corredores partidários produzem. Ele apresenta-se, em termos teóricos desta maneira: [1] como deverão os militantes e/ou simpatizantes partidários (independentemente do partido) votar em consciência quando se sentem representados por facções internas derrotadas; ou [2] porque deverão militantes e/ou simpatizantes partidários votar em listas do seu partido na qual não se sentem revistos (e inclusive tem muito em contra…). Onde termina o militante/simpatizante e começa o cidadão? Que sapos deve ele comer?

Extrapolando as realidades partidárias, é também verdade que para o eleitorado em geral a situação dos sapos se mantêm, uma vez que o seu voto não é individualizado nem pessoal. Está subentendido que o seu voto se diluirá na lista apresentada e, à excepção da eleição presidencial, não é possível saber em concreto nem para onde foram as nossas intenções nem para que contribuiu, realmente, a nossa atitude cívica.
A não ser que nos identifiquemos na totalidade com as listas apresentadas, todos nós comemos sapos em dias de votação.
A questão é, então, saber se o fazemos conscientemente ou se não nos interessa; a questão é de saber se se vomita, a seguir ao repasto (como o fizeram comunistas com Soares) ou se só se arrota (como os militantes dos outros partidos há muitos anos…).

E para se alterar a situação… só se alterando o sistema eleitoral.

Qualquer sistema onde as listas sejam fechadas e ordenadas, como é o nosso sistema, quer a alocução quer a distribuição de eleitos (e quem são) é feita automaticamente. Se as listas fossem abertas… se o voto pudesse ser transferível… talvez já fosse possível aromatizar o tal sapo incómodo; e não ficar, como actor final do processo político (como eleitor), dependente de cozinhados distantes.

E se se referir o processo de escolha de candidatos e da listas (o clube, também no seu ciclo sobre «Sistema Eleitoral Português: que Reforma», em 2006 apresentará duas conferências sobre a democracia e organização interna dos partidos políticos…), pelos exemplos que já apontámos (e poderíamos referir, também, a verdadeira manifestação de escarro e mal dizer que os vereadores santanistas manifestaram, na São Caetano à Lapa, a Carmona Rodrigues), rapidamente concluímos que é urgente que se reflicta sobre as diversas etapas destes processos decisivos.
Se não o fizermos temo que o sistema partidário português actual, como o conhecemos, agudize a crise generalizada que se vive no país. E não teremos muitas mais hipóteses para apresentar resultados. E estes deverão vir de todos os parâmetros da vida política.
Se não apresentarmos resultados, se não conseguirmos repor a qualidade, o mérito e a ideia do Bem Comum (e da prática humilde da política), resta-nos os tais os Sapos, que cada vez se apresentarão mais crus, sem tempero e nem sabor.
A democracia, e com isto termino, não é para isto. Não deve servir para engordas refinadas, deve servir para procurar o «Bem Público», o Bem dos Outros. Não o nosso. Nunca o nosso.

3 comentários:

PPM disse...

Não percebeu a notícia sobre as listas do CDS.

As listas não foram a votos em alternativa, nem tal poderia acontecer...
Uma era a lista à CML, com Nogueira Pinto como cabeça-de-lista, a outra à Assembleia Municipal, com Telmo Corriea como cabeça-de-lista. Acontece que estas listas foram ratificadas pelos militantes, uma por mais que outra. Só isto.

PPM disse...

Faltou assinar o comentário acima.
Diogo Belford Henriques

José Reis Santos disse...

Peço desculpa…

A notícia, conforme foi apresentada no Expresso, dava a entender o confronto directo… Não importa, a verdade é que esse confronto, ainda que não directo, existe. Para o argumento apresentado, creio que se mantêm a validade da provocação: muitos militantes do CDS (ou do PP???) terão de apurar o seu gosto, nas próximas eleições autárquicas.

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