terça-feira, julho 26, 2005

Momento

Nestes tempos acelerados e acelerantes, onde espiões trocam mascarilhas e os códigos aparecem mas páginas públicas e nos ecrãs desfigurados, os «momentos» esquivam-se nas melodias cantadas pelos Coros da Arena.

De toda a cacofonia informativa jorrada recentemente, das diversas jogadas, ainda não entendi a intenção, fria e deliberada, ao melhor estilo de sniper croata, de tornar Alegre o alvo abatido, nesta verdadeira trama inglesa.

Explico:

Percebe-se a vontade, rapidamente assumida, por parte de Sócrates em dar corda ao relógio presidencial. Era sua intenção pôr de parte o episódio Cunha e Quê? e apontar os focos noutras bochechas. Percebe-se, também por parte do governo, que para esse efeito qualquer proto, pseudo, hipotético candidato poderia, pelo menos até Agosto, aguentar o «news cicle» o tempo suficiente para que a entrada na twilight zone algarvia permitisse um retorno autárquico limpo, de cara lavada e energias carregadas.

É neste contexto que se entende os elogios a Freitas.

Paralelamente, dentro do PS, penso eu, e aliás no seguimento de algumas possíveis pressões para a troca de Ministro das Finanças, as movimentações começaram: «Freitas???» nem pensar!!! (diriam alguns). Há que encontrar alternativa na «ala esquerda». Quem? Alegre.

Pois, é neste raciocínio que reside a falácia argumentativa. Nunca Alegre se Soares «andar por aí» … A questão é: saberia Alegre das intenções de Soares? Não acredito que não soubesse. Ou melhor, acredito que o «pitch» que lhe fizeram, a Alegre, foi num cenário onde o poeta se apresentaria como grande conciliador de uma atitude frentista contra o «Encoberto» da direita. E Alegre, que até tem ambições presidencialistas (que nunca as escondeu), levado pela tela que lhe pintaram, aceitou o proposta (aliás, deve de ter entendido que, com o pseudo apoio a Freitas, tinha terreno livre para aparecer à esquerda e obter o apoio do partido antes de Agosto, e aí fechar a nomeação…).

O seu erro foi não calcular Soares, ou não quere-lo calcular. O erro dos seus, resta saber se deliberadamente ou não, foi de o não jogarem com Soares. Se a intenção era liquidar Alegre, terminar a sua carreira política nos bancos traseiros da Assembleia, então é caso para dizer «mission accomplished». Mas quem? Os que o empurraram para a liderança do PS? Quem poderia lucrar com tal definitivo afastamento? Não acredito que Alegre agisse a solo.

Regressando ao embate presidencial: não acredito que Freitas ou Alegre queiram reeditar o combate fratricida de 85 no célebre Soares/Zenha e Pintassilgo (quem seria quem, 20 anos passados?). Além do mais, perderiam. Ambos. Se tivéssemos hábitos de eleições primárias à séria…

Partindo do principio que é Soares o eleito contra o «campeão da direita», além de ter o meu apoio por diversas razões, como encontramos «Zenha» e «Pintassilgo»? Freitas viu o seu espaço, a sua oportunidade e procurou a desmarcação (até conseguiu o pré apoio de Sócrates), ao verificar que corria o risco de se apanhado em posição fora de jogo, rapidamente recuou. Este jogo de pés manteve-o em jogo. Alegre não fez nada disso, e ainda quer protestar com o arbitro…

Curiosos, estes tempos políticos: Soares, Cavaco e Freitas, partilhando, de novo, a Arena da Política, como atracções principais (aqueles como candidatos presidenciais e este como um esperado activo MNE).

O grande beneficiado é Sócrates, que untado pela fortuna da agenda noticiosa, não só procedeu à necessária pit stop governamental (era fundamental trocar de Ministro das Finanças para se obter melhor margem nas eleições autárquicas), como encontrou o candidato que melhor se serviria. Em caso de derrota de Soares, é o ex-presidente que fica em cheque e acarreta com as responsabilidades. Em caso de vitória, é interessante, talvez seja o cenário mais complicado para o PM… com Soares em Belém, Sócrates escapa-se da faca aguçada do Encoberto, é verdade, mas ganha uma amarra à esquerda que provavelmente preferia ter como lastro.

Concluindo, boa trama, nesta original e inovadora peça em cena no nosso plateu político. Apesar dos bons actores, do argumento trabalhado, das reviravoltas angulares, temo que sejamos abandonados ao aborrecimento de um bloco central em banho-maria, em brasa curta esperando ateio na reentre. Aí sim, a confirmarem-se as previsões meteorológicas, esperam-se elevados riscos de incêndio….

2 comentários:

Raul Moreira disse...

Amigo José,

Talvez que o melhor que pudesse acontecer ao actual Primeiro Ministro seria termos por Presidente a "longa e esquálida figura de respeito revestida que guarda a foice numa mão e a ampulheta na outra, trazendo ao peito a palavra TABU".

Reforçaria o seu poder no Partido encontrando algo de essencial, nos dias que correm, para qualquer Político que se preze: um Inimigo a sério, que meta medo aos correlegionários.
Que forma ideal de "meter no saco" todas as oposições de Esquerda...

É claro que para o País propriamente dito a conversa seria outra e bem diferente.

Mas desde quando a classe política tem mostrado verdadeiramente preocupação pelo País?

Só na medida em que essa "mostra" lhes renda votos e benesses...

Ant.º das Neves Castanho disse...

Curiosa relação com as Presidenciais de 85...

Só acho que faltou um dado a esta interessante análise: Alegre pode ter sido uma hipótese como candidato, mas não é nem nunca seria credível como Presidente da República. Acho que ele deveria ter sido o primeiro a constatá-lo. Agora não pode queixar-se...

Quanto a Freitas, a sua meta não é 2006, mas sim 2011, já que pela primeira vez na nossa democracia não estou a ver Soares recandidatar-se a um segundo mandato...

Pesquisar neste blogue