sexta-feira, janeiro 18, 2008

Lei Autarquica

Aqui neste blogue temos dedicado ampla atenção às questões relacionadas com matéria eleitoral. Há dois anos organizámos um colóquio sobre a reforma do sistema eleitoral (para a Assembleia da República), que terminou com a apresentação de proposta própria em sede parlamentar.
Hoje, como sabem, está na agenda política a questão eleitoral; quer para a eleição parlamentar, quer para as Autarquias.
Sobre o processo hoje em decurso, temo que tudo esteja a ser executado nas costas da opinião pública, e publicada, sem o devido escrutínio público que matérias desta importância devem ter.
Vejo que sobre a matéria autárquica o Daniel Oliveira colocou, hoje, um longo post.

Uma lei eleitoral muda-se quando tem mesmo de ser. São necessárias décadas para que os eleitores a compreendam, a usem com objectivos que devem ser respeitados (umas vezes garantir estabilidade, outras impedir abusos de poder, umas garantir a continuidade, outras regenerar os cargos políticos) e para se sentirem confortáveis com ela. Era necessário mudar a lei eleitoral autárquica? Vejamos: [continue a ler aqui]

Concordo com a premissa inicial: porquê a necessidade de mudança? E concordo também com parte do argumentário exposto. Parece-me óbvia a necessidade da eleição simultânea da Vereação e da Assembleia Municipal, mais ainda depois do episódio de Lisboa; e que já não se entende, do ponto de vista sistémico, o poder de voto dos Presidentes de Junta (mais ainda quando se está a reflectir sobre a reordenação administrativa da Cidade).
O que está em causa, e esse é um tema que o Daniel não pega, é que modelo político queremos para as nossas cidades. Este é que é o debate que tem de ser feito. Qual o papel das Freguesias? Qual a sua ligação com a Autarquia? Que modelo autárquico? Um modelo maioritário? Ou pluralista? O deve ser entendido como governabilidade autárquica?
A nova lei subentende que a boa governação necessita estabilidade executiva, e por isso «constrói» executivos fortes. E em teoria não está errada; pois a execução da política pública sufragada deve poder ser possível. Ou seja, quem for eleito deve ter a possibilidade de executar o seu programa eleitoral. Tem de ter os meios de colocar em prática o seu projecto político conforme apresentado ao eleitorado.
Se pensarmos nos elementos necessário para a execução de políticas públicas, na articulação necessária entre o topo e a base, observamos que um modelo maioritário faz sentido. Imaginem que há um presidente de Câmara com vereadores da oposição no executivo. Com pelouros. Qualquer relação política que poderão desenvolver terá de ser limitada, pois ambos defendem projectos políticos diferentes. E como se resolvem os conflitos? Por acordos, que muitas vezes ultrapassam os actores locais para serem decididos pelas direcções nacionais. Sempre fora dos olhares dos eleitores, que apenas assistem.
O mesmo acontece na restante escada hierárquica, ao nível das directorias. Faz algum sentido que director A de partido B vá executar a política de partido C? o que o impede de boicotar a implementação das directrizes recebidas? O que o impede de favorecer o seu partido?
É esta a situação actual; agravada pela falta de cultura cívica e política da maioria dos titulares de cargos de chefia, que são politicamente nomeados mas que não se demitem quando o cenário política se altera, esperando por uma demissão forçada, de preferência bem negociada (financeiramente, entenda-se). Se correlacionarmos este exemplo com o estado dos Partidos Políticos e com a questão do acesso è rede distributiva de recursos do Estado, facilmente concluímos que não é do interesse de alguns quebrar este quotidiano (nomeadamente do PCP, PSD, PS essencialmente, mas também CDS e agora o BE); muito pelo contrário, a sua persistência significa um porto seguro na gestão das redes de poder internas e na manutenção de um mercado eleitoral fixo.

Na base deste argumento, como se depreende, encontra-se a premissa de que é necessário confiança na implementação de políticas públicas. Confiança política, em última análise. E eu temo que, no sistema vigente, esta seja negociada e não assumida.
Mais, observando o comportamento interno de algumas câmaras, verifica-se que os exemplos de «sabotagem política» multiplicam-se, que a inércia institucional é uma constante; e que uma relação que se quer dinâmica fica refém da capacidade negocial dos intervenientes.
O que defendo é, então, uma definição clara do que é a hierarquia de execução; ou seja, o que necessita o executivo para colocar em prática a sua política. Esta definição tem de ser transparente e criteriosa.
Um sistema, se quisermos, mais americanizado, género «winner takes all», onde se sabe, porque está pré-determinado, que X lugares são directamente dependentes da administração política vigente. Cada 4 anos vagam. Para que o próximo projecto político possa ser executado.
Parece-me ser este o espírito da Lei, mas julgo que não é neste sentido que o debate se tem desenrolado. Com pena, porque esta é a altura para o fazer.

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