Eu bem sei que há que promover o que é nosso (mesmo vendendo férias...). Sei também que toda a publicidade é pouca para passarmos a mensagem. Só não sei é se as pessoas verdadeiramente leram o que promovem. Duas ou três achegas sobre o último número da Atlântico, nomeadamente sobre os artigos do Rui Ramos e do Henrique Raposo:
- Conheço o Henrique já há algum tempo, e sinceramente acho que contraiu aquele vírus que atinge geralmente quem se define como defensor de posições autodefinidas de minoritárias, anti-sistémicas e «polémicas»: só reconhece como interlocutor grupos ainda mais marginalizados que o seu, de preferência fanáticos e pouco estruturados intelectualmente, e escreve em função deles. Complexo? Não. Basta ver o que ele escreve na tal revista que se quer de referência. Para o Henrique toda a esquerda é neo-marxista, manifesta-se contra o G-8, ataca bombas da Shell e amarra-se a centrais eléctricas no Iraque. É, obviamente, anti-americana, profana e retrógrada. Eu percebo o Henrique, e as suas inspirações lidas e induzidas. Não entendo é a falta de argumento e a falta de «ética» de quem se apregoa arauto de alguma coisa / grupo / ideologia / partido (escolher).
- Não entendo o que faz mover quem escreve baseado em juízos fáceis, negativismos e clichés. É obvio que o Henrique não escreve para ser lido. Ele escreve para ser «odiado». Essa é a sua ambição: ser polemista, ser acertivo na análise, inteligente na construção e corrosivo na critica. Ela até poderá alcançar os seus objectivos, mas será sempre como elemento menor, representante de uma corrente que se quer minoritária por conveniência; é que é muito fácil defender somente um canto, e só defender. Não há propostas, não há visão de futuro, não há qualquer articularidade entre a ideia a conceber e a sua praticabilidade política (aliás, não existe qualquer espaço para a conceptualização de ideias ou de reflexões, uma vez que a estratégia é, menosprezando sempre o adversário, defender o espaço «moral da direita liberal», como se este estivesse em extinção e necessitasse de resgate).
- Agora, sobre o tão «vendido» Rui Ramos, acho que, mais uma vez, a leitura dos seus escritos é auto-explicativa. Acho que ele deve ter ou sido monárquico reconvertido ou liberal atrasado na I Republica. Não se entende o ódio descabido ao Partido Republicano Português, e, mais tarde, ao Partido Democrático. Não se entende que um dos mais conceituados historiadores da nação (é assim que assina) confunda regimes com grupos políticos, que reduza toda uma experiência histórica à personagem malvada e malfeitora de Afonso Costa e seguidores. Não é correcto, não é verdade, não é científico. Se esse senhor quer que o leiamos com atenção, porque podemos pensar que nos vai procurar transmitir alguma ideia, ou reflexão, terá de se apresentar bem mais robusto, sólido e documentado (então não houve um presidente forte na I República porque os Democráticos tinham medo de que ele não fosse «um deles»? como poderia isso acontecer se o mesmo partido controlava o sistema de forma a não deixar que nele ninguém entrasse? Tem de haver critério.
- Ainda sobre o artigo do Rui Ramos, entende-se muito do que escreve pelo posicionamento do autor face quer ao lugar da Presidência da República (decididamente o senhor é não só anti parlamentarista, é presidencialista puro) quer ao futuro ocupante por si desejado. Estes posicionamentos neo-sidonistas, nada novos, só reflectem uma vontade revanchista de quem não teve a oportunidade de definir o sistema político actual. Esquecem, esses palatinos da «moral liberal» que a construção do Portugal Democrático, erigidos na Assembleia Constituinte, foi suficientemente plural e dinâmico para permitir uma diversidade política que faculte, hoje, uma hipótese de futuro.
Concluído, em relação ao Rui Ramos não podemos correr o risco de multiplicar por aí Hermanos Saraivas; as ideias próprias não fazem factos históricos e as suas opiniões, sempre válidas é certo, devem de ser argumentadas e consubstanciadas. Temo pelo desconhecimento geral que leve a que o que Rui Ramos escreve seja entendido como verdade ou, pior, como «A Verdade». Sobre o Henrique, penso que perdeu uma boa oportunidade de analisar os fenómenos neo-marxistas, que existem, de uma forma séria e pertinente e do ponto de vista ideológico da «sua direita». Ao se refugiar nesse canto moral da tal direita liberal, não só perdeu interesse como manifestou traços de arrogância e de altivez moral insuportável. Curiosamente acaba por manifestar ser endémico à direita o que muito critica à esquerda: uma soberba e sobrancearia moral incapaz de promover diálogos.
1 comentário:
Em relação ao Rui Ramos, acho que é um dos historiadores, se não o historiador, que melhor escreve em Portugal. Os seus textos fluem como um romance. No entanto, em termos de conteúdo, o caso muda de figura. Não concordo com as suas opiniões sobre o cariz caceteiro da 1ª República, embora também ache que, por vezes, é importante confrontar-mo-nos com ideias muito diferentes das que são geralmente aceites.É quase sempre dessa confrontação que nasce a verdade. É certo que a 1ª República não foi um regime dominado por um bando de malfeitores, mas, de igual forma, não foi um paraíso democrático.
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