quarta-feira, junho 07, 2006

Proposta G

PROPOSTA G

PROJECTO DE SISTEMA ELEITORAL PARA A ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

1. Razão de ordem
Partindo de uma estrutura próxima da proposta apresentada pelo XIII Governo Constitucional, procurar-se-á dar resposta a duas preocupações distintas: melhorar os índices de proporcionalidade do sistema eleitoral e avançar uma forma de compatibilizar a eleição de deputados em círculos uninominais com o respeito estrito pelo princípio da proporcionalidade. A conjugação dos dois objectivos vai implicar o recurso aos três tipos de círculos eleitorais previstos na Constituição: círculos uninominais, círculos plurinominais (regionais) e círculo nacional.

2. Círculos eleitorais
O número total de Deputados seria fixado no máximo permitido pelo texto constitucional: 230 deputados. Destes 230 deputados, 228 seriam eleitos pelos círculos eleitorais do teritório nacional, da seguinte forma:
- Metade (114 deputados) a eleger em círculo nacional
- Metade (114 deputados) a eleger em círculos parciais
A cada um dos círculos parciais corresponderia um número par de Deputados. Para além disso, cada círculo parcial seria dividido em círculos uninominais, em número igual a metade dos lugares atribuídos ao respectivo círculo eleitoral. Assim sendo, existiriam 57 círculos uninominais de candidatura distribuídos pelos círculos eleitorais parciais.
O critério para a delimitação de todos os círculos teria por base a dimensão média dos círculos uninominais. Chegamos facilmente a esse número através da divisão do número de cidadãos eleitores (cerca de 8,7 milhões) pelo número de círculos uninominais propostos (57): cada círculo uninominal deveria ter um número de eleitores na casa dos 152 mil.
De seguida haveria que proceder à arrumação dos círculos uninominais nos respectivos círculos parciais. O principal critério a ter em conta nesta operação deve ser o funcionamento da proporcionalidade. A forma mais indicada de garantir índices de proporcionalidade elevados consiste em eleger um número considerável de deputados em cada círculo. Impede-se, desta forma, o aparecimento de cláusulas-barreira implícitas ao nível dos círculos parciais.
Tomando como referência os dados recentes do recenseamento eleitoral, é possível fazer um pouco de experimentação nesta área. Sendo certo que as simulações que agora se apresentam carecem da profundidade e do rigor científico que exigiriam delimitações reais de círculos eleitorais e que muitas das soluções apontadas têm um cariz consideravelmente artificial, porque não se articulam com circunscrições administrativas vigentes, ainda assim podem fornecer uma ideia geral sobre a formas de concretizar a presente hipótese de trabalho. Mais do que um mapa para delimitação futura dos círculos parciais, as simulações realizadas servem, essencialmente, para explicar o funcionamento do sistema e demonstrar a sua viabilidade. O facto de quer a regionalização, quer o mapa de desconcentração de serviços da Administração Central permanecer uma questão em aberto impede, tendencialmente, opções definitivas quanto ao desenho do mapa eleitoral do país.
O modelo A assenta na criação de 11 círculos parciais de dimensão intermédia (entre 8 e 12 deputados), enquanto o modelo B opta por círculos de dimensão acima da média (entre 18 e 24 deputados). Uma solução do tipo do modelo B apresenta vantagens claras ao nível do funcionamento da proporcionalidade. Contudo, face à eventual necessidade de fazer concessões à estabilidade governativa, o modelo A apresenta soluções igualmente válidas em sede de proporcionalidade.
Em qualquer dos modelos, Açores e Madeira constituem um círculo próprio e com apenas 4 deputados. Trata-se, porém, de matéria algo problemática, a desenvolver quando referirmos os problemas específicos das Regiões Autónomas.
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a) Círculo nacional
Na proposta apresentada pelo XIII Governo Constitucional, o recurso a um círculo nacional assumia duas funções essenciais, surgindo como “válvula de segurança” [1] do sistema e como “zona livre de personalização”[2]. O seu carácter de “válvula de segurança” resulta do facto de permitir “encaixar” os mandatos supranumerários e garantir a eleição de todos os candidatos vitoriosos nos círculos uninominais. Enquanto “zona livre de personalização”, o seu papel é o de dar aos partidos a possibilidade de reservar lugares para os seus dirigentes nacionais ou figuras “ministriáveis”.
O aumento do número de deputados a eleger neste círculo em comparação à proposta do XIII Governo deve-se essencialmente a dois factores: à necessidade de garantir a “absorção” de todos os potenciais mandatos supranumerários[3], e ao desejo de assegurar uma melhoria dos índices de proporcionalidade do sistema. Parece-nos ser esta a principal forma de assegurar a sobrevivência do multipartidarismo e de travar a tendencial bipolarização da vida política portuguesa.
Contudo, a Constituição exclui um sistema de círculo nacional único ao exigir a eleição dos deputados por “círculos”, no plural. Trata-se de uma opção que visa favorecer a governabilidade, preterindo ligeiramente a proporcionalidade pura e o seu efeito “pulverizador”[4] da representação parlamentar. Porém, parece-nos defensável a instituição de um círculo nacional com a dimensão proposta (114 deputados), uma vez que conseguirá reforçar os índices de proporcionalidade, sem fazer disparar o número de partidos representados na Assembleia.
Um círculo eleitoral demasiadamente pequeno (30 a 40 deputados) pode não ser suficiente para garantir a absorção dos supranumerários dos círculos parciais. Um círculo de dimensão média, por outro lado, pode ser utilizado para desvirtuar a propocionalidade do sistema, visto que retiraria deputados aos círculos parciais, reduzindo os índices de proporcionalidade destes últimos, sem oferecer uma adequada compensação para essa perda de proporcionalidade.
Para concluir a exposição relativa à criação de um círculo nacional de 114 deputados, cumpre frisar que esta não pode ser apreciada sem se ter em conta o funcionamento dos demais aspectos do sistema: a dimensão proposta para os círculos parciais (Alternativas A e B) e a existência de círculos uninominais de candidatura. Como veremos nas simulações realizadas, o funcionamento global do sistema alcança o objectivo proposto de tornar os resultados mais proporcionais, beneficiando a representação dos pequenos e médios partidos (CDS-PP, CDU e Bloco de Esquerda).

b) Círculos parciais
Quanto aos círculo parciais, optou-se por um modelo distinto da clássica divisão distrital, procurando, de forma autónoma de outras considerações de natureza política ou administrativa, optar pela solução mais racionalizador e potenciadora de resultados proporcionais. Neste domínio, quer a alternativa A, quer a alternativa B que apresentámos procuram demonstrar as possibilidades de transcender a divisão administrativa distrital, criando círculos supradistritais[5], infradistritais[6] ou interdistritais[7]. Desta forma, os vários círculos parciais elegerão um número aproximadamente idêntico de deputados[8], o que contribuirá para a existência de índices de proporcionalidade muito próximos em todos os círculos. Ressalva-se, evidentemente, o caso excepcional das Regiões Autónomas, que abordaremos separadamente.

c) Círculos uninominais
A principal questão que se prende com os círculos uninominais na proposta acima apresentada respeita ao seu número e dimensão. A opção pela eleição de apenas um quarto dos deputados à Assembleia da República com recurso ao círculo uninominal prende-se, essencialmente, com duas razões. Em primeiro lugar, subjaz a esta escolha uma preocupação geral de carácter técnico, em relação ao funcionamento do sistema eleitoral. O grande problema que a introdução de círculos uninominais de candidatura acarreta reside na impossibilidade do sistema aceitar a figura do deputado supra-numerário. Neste contexto, limitar os círculos uninominais a 57 implicará uma redução drástica das probabilidades da ocorrência de supranumerários, já que, como vimos, o círculo nacional absorverá os deputados eleitos em “excesso” em cada círculo parcial.
Em segundo lugar, e apesar do monopólio partidário na apresentação de candidaturas e do princípio da representação de todo o país pelos deputados, episódios recentes da vida parlamentar[9] suscitam algumas reservas em relação a uma excessiva independência de alguns deputados. Apesar dos vícios do sistema político não poderem ditar as soluções a adoptar em sede de legislação eleitoral, não pode o legislador pura e simplesmente ignorá-los. Uma Assembleia da República em que metade (ou quase metade) dos deputados dispõe de uma legitimidade democrática quase directa[10], será bem mais permeável à “negociação” e bem mais dificultada no trabalho de gerar maiorias parlamentares sólidas, do que uma Assembleia da República onde apenas um quarto dos deputados dispõe de contacto directo com uma fatia específica do eleitorado.
O parecer da Universidade Católica à proposta do XIII Governo Constitucional pronuncia-se desfavoravelmente em relação ao número de cículos uninominais consagrados naquele Anteprojecto[11]. Entendem os autores do parecer que, as 94 circunscrições a criar, cada com uma média de 88 mil eleitores, apresentariam uma dimensão excessivamente elevada para assegurar uma verdadeira aproximação entre eleito e eleitor. Sendo que o modelo que agora veiculamos reduz esse número a 57 círculos uninominais, com uma média de 150 mil eleitors por círculo, é imperativo demonstrar a adequação de tal sistema aos objectivos de personalização.
O caso alemão é elucidativo da possibilidade de funcionamento da personalização em círculos uninominais com um elevado número de eleitores. Após a reforma das circunscrições eleitorais em 1998, cada círculo uninominal engloba, em média, cerca de 205 mil eleitores. A taxa de variação em relação à média foi fixada nos 25%, pelo que o número apontado poderá oscilar entre o mínimo de 153 mil eleitores e o máximo de 256 mil por círculo. Mesmo antes da reforma de 1998, a média alemã situava-se em cerca de 185 mil eleitores por círculo. A adoptar a mesma percentagem de variação de 25% (o projecto do XIII Governo ficava-se pelos 20%), a variação máxima dos círculos uninominais portugueses ficaria na casa dos 190 mil eleitores, ainda assim abaixo da média alemã!
Outro dado comparativo importante é-nos dado ao nível dos municípios de grande dimensão. É inegável que, mesmo em municípios com centenas de milhar de eleitores, a relação entre eleitos locais e eleitores é de um grau de considerável proximidade. Raríssimo será o munícipe de Lisboa, Porto, Sintra ou Vila Nova de Gaia que desconheça o nome do seu Presidente de Câmara, e, no entanto, em todos estes casos há mais de 200 mil eleitores no município (em Lisboa rondam os 550 mil). Não significa o exposto, contudo, que neguemos a validade do princípio de que quanto mais pequenas as circunscrições forem, mais próximo será o contacto dos candidatos com os cidadãos. Apenas pretendemos demonstrar que os números propostos ainda são aptos para produzir o efeito de personalização desejado.
Uma nota final no que toca à delimitação dos círculos eleitorais tem a ver com a necessidade de extrema cautela na definição do seu âmbito geográfico, particularmente no que toca aos círculos uninominais. As práticas de manipulação da delimitação de círculos há muito que desapareceram da história eleitoral portuguesa, mas a memória da “Ignóbil porcaria” de 1901 e de outras práticas de gerrymandering deve forçar o legislador a criar apertados mecanismos de fiscalização do desenho dos mapas eleitorais, caso se avance para a reforma do sistema eleitoral. Os critérios de delimitação de círculos uninominais constantes da proposta do XIII Governo Constitucional são, em geral, de abraçar, havendo que proceder a apenas um ajuste para os compatibilizar com a proposta aqui apresentada:
- os círculos uninominais, devem ter um número de eleitores compreendido entre 75% e 125%[12] da média resultante da divisão do número total de eleitores pelo número total de círculos uninominais[13];
- o território dos círculos deve ser contínuo;
- os círculos uninominais devem corresponder a municípios (ou sua agregação) ou a agregações de freguesias de um mesmo município (só excepcionalmente se admitindo a fusão de freguesias de municípios diversos);

3. Regime de eleição
A solução proposta para o método de eleição é muito próxima da proposta do XIII Governo. Cada eleitor (com excepção dos residentes no estrangeiro) tem um voto duplo. Com o seu primeiro voto (semelhante à Erststimme alemã) escolhe o seu candidato no círculo uninominal. Com o seu segundo voto (semelhante à Zweitstimme alemã) vota no partido candidato no seu círculo parcial. Este segundo voto releva igualmente para o escrutínio no círculo nacional. Ou seja, apesar de cada cidadão dispor de um voto duplo, na realidade ele será “triplo” na medida em que a soma dos resultados obtidos por cada partido nos círculos parciais vai ditar a conversão de votos em mandatos no círculo nacional. Até aqui, seguimos a proposta de lei do XIII Governo Constitucional.
Seguimos também a proposta de 1998 no que toca à organização das listas: uma candidatura a um círculo uninominal implicará candidaturas aos círculos parcial e nacional, uma candidatura ao círculo parcial implicará uma candidatura ao círculo nacional e, finalmente, uma candidatura ao círculo nacional implicará, pelo menos, uma candidatura a um círculo parcial. No que toca à possibilidade de candidaturas simultâneas aos 3 círculos eleitorais, apesar de não nos opormos, em princípio, à regra constante da proposta do XIII Governo Constitucional, entendemos que deve ser imposto um limite ao número de candidatos “duplos” e “triplos” por candidatura.
O principais problemas começam a surgir quando for necessário articular os resultados finais nos diversos níveis de candidatura e apuramento. Já mencionámos diversas vezes o problema dos deputados supranumerários, isto é, candidatos vencedores nos círculos uninominais sem que o respectivo partido tenha alcançado um número suficiente de mandatos no círculo parcial de apuramento para os “encaixar”. A ocorrência deste fenómeno não será tão infrequente quanto isso, já que são vários os factores a contribuir para a sua verificação: votações geograficamente localizadas de certas formações partidárias, regiões onde o terceiro partido político tem um peso eleitoral próximo dos dois primeiros, taxas de abstenção discrepantes entre círculos uninominais do mesmo círculo parcial, voto estratégico, candidatos carismáticos de pequenos partidos, entre outras.
Uma vez que um dos objectivos da reforma é personalizar a relação entre eleitor e eleito, são de rejeitar as soluções que passam pela perda dos deputados eleitos pelas circunscrições uninominais acima da quota do partido. Não é aceitável que, por dificuldades em assegurar a inclusão entre os deputados à Assembleia da República de um candidato vencedor em círculo uninominal, esse círculo uninominal deixe de ter representante na parlamento. A existência de apenas 57 círculos uninominais, bem como a possibilidade de recorrer aos resultados do partido no círculo nacional (que elege, não nos esqueçamos, 114 deputados) para proceder à compensação, são factores que nos levam a considerar que o problema dos mandatos supranumerários ficará substancialmente resolvido. Contudo, o problema só fica resolvido para os partidos que alcançam representação no círculo nacional. Como veremos de seguida, as principais dificuldades colocam-se em sede de partidos com pouca expressão eleitoral nacional, mas que conseguem eleger em círculos uninominais.

O problema da vitória apenas em círculo uninominal
Ligeiramente diversa e bem mais problemática é a vitória de um partido num círculo uninominal sem ser eleito ninguém no respectivo círculo distrital, nem no círculo nacional (ou da eleição no círculo nacional de menos deputados do que o número dos deputados excedentários).
Uma personalidade carismática, com apoios suficientes e que acredite na possibilidade de ser eleito em determinado círculo uninominal, pode facilmente contornar a exclusividade dos partidos políticos na apresentação de candidaturas. Basta-lhe para tanto recolher as 5000 assinaturas necessárias à inscrição de um partido e candidatar-se a um círculo uninominal, apresentando candidaturas aos círculos nacional e parcial apenas com o intuito de cumprir a exigência da legislação eleitoral. Ao nível de pequenos partidos políticos institucionalizados o problema pode colocar-se da mesma forma. Uma vez que o voto dos eleitores é duplo, os riscos de verificação desta hipótese são bem reais, na medida em que o eleitor não tem de abdicar do voto no partido que quer no Governo para eleger o candidato individual da sua preferência, mesmo que este represente uma formação partidária minoritária.
Como solucionar um problema desta natureza? O sistema eleitoral a instituir não pode deixar uma questão desta natureza em aberto, pelo que passaremos a enunciar as várias hipóteses de solução avançadas pela doutrina e pelo legislador.

1) A solução do Anteprojecto de Código Eleitoral (1987) passava pela sua não eleição. Será sem dúvida uma forma de garantir o respeito pela Constituição e pelo estrito cumprimento do princípio da proporcionalidade. Mas, como referimos anteriormente, não é uma solução aceitável da perspectiva dos fins de personalização do sistema eleitoral: uma circunscrição eleitoral uninominal não pode deixar de ter o “seu” deputado em S. Bento.

2) Outra hipótese passa por descontar o deputado eleito ao número total de deputados a eleger pelo círculo nacional, o qual passaria a ter menos de 114 deputados. Contudo, não parece ser esta uma solução conforme ao princípio da proporcionalidade, já que o deputado em causa seria titular de uma legitimidade exclusivamente maioritária e o seu partido não teria alcançado o número de votos necessários para elegê-lo como deputado.

3) A proposta do XIII Governo Constitucional partindo, de certa forma, desta última ideia, acaba por apresentar uma solução capaz de ultrapassar algumas dificuldades (mas não todas…). Se a lista em causa não lograsse obter qualquer mandato no círculo nacional, ficcionar-se-ia um círculo nacional único de apuramento (ou seja, para todos os 228 mandatos) para determinar se esse partido elegeria nessas condições algum deputado. Em caso afirmativo, o mandato em excesso ser-lhe-ia atribuído, descontando-se um lugar ao número de mandatos a atribuir no círculo nacional.
Imaginemos, por hipótese, que o MRPP ganhava a eleição no círculo uninominal X. Ficcionado um círculo nacional único para determinar se o MRPP teria direito a algum deputado e caso concluíssemos que sim, ser-lhe-ia atribuído o mandato conquistado no círculo X, e o círculo nacional passaria a eleger apenas 113 deputados. Trata-se de uma solução plenamente conforme com o princípio da proporcionalidade mas que deixa em aberto uma questão: e se o partido em causa não obtivesse qualquer lugar através do recurso ao círculo nacional único ficcionado?

Solução proposta
Como vimos, a existência de 114 deputados no círculo nacional servirá plenamente para absorver os deputados excedentários dos partidos que aí obtenham representação parlamentar. Os problemas colocam-se precisamente com os partidos que não alcancem mandatos no círculo nacional (ou mesmo no círculo parcial) que lhes permita compensar os “excedentes”. Nesses casos, deve recorrer-se em primeiro lugar ao sistema proposto na proposta de lei do XIII Governo Constitucional, ficcionando a aplicação do método d’Hondt em círculo nacional único, nos termos atrás descritos. Só nos casos em que, ainda assim, não seja possível atribuir o mandato se deve recorrer à solução que se segue.
Nos casos sob escrutínio, torna-se evidente que a opção terá de ser entre manter o deputado, cedendo ao princípio maioritário e à intenção de personalização, ou fazer vingar a propocionalidade, não o elegendo. Face a tudo o que expusemos, é quase evidente que a nossa opção passa pela não eleição daquele candidato. Entendemos, contudo, que a necessidade de assegurar a presença daquele círculo eleitoral em S. Bento justifica um mecanismo de salvaguarda.
Encontramos três alternativas possíveis para salvaguardar a personalização.
A primeira delas passa pela atribuição ao candidato colocado em segundo lugar a qualidade de deputado pelo círculo uninominal. Apesar de solucionar o problema, sofre de um vicío quase fatal: efectivamente, aquele candidato não recolheu as preferências de uma maioria de cidadãos eleitores daquele círculo.
A segunda opção passa pela realização de um segundo escrutínio para escolha do candidato que vai assegurar o elo de ligação do círculo uninominal com o Parlamento. Apenas acederiam a esta segunda volta os partidos que estivessem em condições de “absorver” o mandato do deputado a eleger naquele círculo. Os eleitores poderiam reagir desfavoravelemente ao facto de a sua primeira escolha não poder assumir o lugar, contudo a função dos círculos eleitorais uninominais no sistema proposto não é a da eleição directa de deputados, mas a de escolha do candidato de um partido para tomar lugar entre os mandatos que cabem a esse partido: os círculos são de candidatura, não de apuramento.
A terceira e última hipótese, passa pela instiuição do sistema de voto alternativo ou preferencial para os círculos uninominais, evitando a realização da segunda volta. Apesar de garantir a realização num só dia da eleição de deputados para a Assembleia da República, dotaria o sistema de tal complexidade, que o torna particularmente inadequado: seria extremamente difícil explicar com precisão ao todos os eleitores a necessidade de votar duas vezes (para os candidatos no círculo uninominal e nas listas dos partidos) uma das quais através da ordenação preferencial do seu candidato, apenas para precaver uma situação quase académica.
Assim sendo, optamos claramente pela segunda opção: realização de uma segunda volta, à qual acederiam apenas os partidos em condições de integrar o candidato eleito no seu número de deputados. Não estaria em causa o resultado do acto eleitoral, visto que cada partido saberia de antemão quantos mandatos disporia na nova Legislatura. O vencedor das eleições estaria encontrado, apenas não seria certa a identidade de um (ou mais) dos deputados à Assembleia da República. Se considerarmos ainda que a realização desta segunda volta se revestiria sempre de carácter excepcionalíssimo, encontramos poucos argumentos contra a sua realização.

4. As Regiões Autónomas
Um dos problemas de resolução mais difícil na elaboração da presente proposta diz respeito ao lugar das Regiões Autónomas no sistema eleitoral para a Assembleia da República.
Círculo parcial único para Açores e Madeira
A primeira questão de algum melindre é a existência na nossa proposta de um único círculo parcial de apuramento, elegendo 4 deputados e abrangendo o território de ambas as Regiões Autónomas. Porém, face ao número de deputados que cabem aos Açores e Madeira, e às necessidades de elevar os índices de proporcionalidade, a instituição de dois círculos, elegendo dois deputados cada iria manifestamente contra o espírito global da reforma. Já a consagração deste “círculo insular único” é um desvio considerável em relação aos demais círculos das alternativas A e B.
Atente-se, porém, ao facto de a existência de um “círculo insular único” não obstar à consagração na legislação eleitoral da apresentação separada de listas em cada uma das regiões autónomas, agregadas apenas para efeitos de apuramento[14]. Desta forma salvaguardar-se-ia a identidade de cada região e permitir-se-ia às estruturas partidárias regionais apresentar listas de candidatos provenientes de cada um dos arquipélagos.

Círculo uninominal único em cada região
A segunda questão melindrosa é consequência directa da primeira: apenas existiriam dois círculos uninominais no território das regiões autónomas. Tendo ficado estabelecida uma média nacional de cerca de 152 mil eleitores por círculo uninominal, haveria que proceder a um pequeno ajustamento na lei eleitoral para salvaguardar a especificidade das duas regiões. Os Açores, com cerca de 190 mil eleitores, ainda cabem dentro da margem de oscilação máxima (o máximo de eleitores permitido de acordo com a regra geral de oscilação máxima de 25% seria de 190 mil por círculo uninominal). No caso da Região Autónoma da Madeira, com aproximadamente 230 mil eleitores, já seria necessária a consagração de um desvio excepcional à margem de flutuação permitida. É uma solução que em nada choca com os princípios enformadores da reforma, e que se limita a adaptar o sistema eleitoral à realidade geográfica e demográfica daquela região.

Número de deputados insulares
Uma das principais críticas a que o sistema pode estar sujeito respeita ao número de deputados a eleger pelos cidadãos das Regiões Autónomas, em comparação ao seu actual peso na Assembleia da República. Enquanto neste momento os dois arquipélagos elegem 11 deputados ao Parlamento, com o sistema proposto passariam a eleger apenas 4. Há no entanto vários argumentos que demonstram que as Regiões Autónomas apenas estariam a ser tratadas em completa paridade com o resto do território português. A perda de deputados deve-se única e exclusivamente à criação de um círculo nacional de 114 deputados. Assim sendo, há que não esquecer que cada uma das regiões dispõe de suficiente peso político para se impor facilmente no seio dos diversos partidos políticos e alcançar a sua representação nas listas nacionais.

5. Os eleitores residentes no estrangeiro
O último aspecto da reforma do sistema eleitoral para a Assembleia da República que desejamos abordar diz respeito ao voto dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro. Trata-se, sem margem para dúvidas, de um dos aspectos mais polémicos na legislação eleitoral portuguesa actual, que levanta duas grandes preocupações na doutrina. Vamos apenas focar o problema da delimitação dos círculos eleitorais para a emigração, aceitando para efeitos da nossa análise o status quo actual, de inclusão dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro no colégio eleitoral para a Assembleia da República.

Proporcionalidade e círculos da emigração
O fundamento para a ausência de proporcionalidade reside no próprio artº 149º nº 2 CRP, que apenas prevê a existência de um número proporcional de deputados em relação ao número de eleitores inscritos para os círculos plurinominais do território nacional. Daí retira a actual legislação eleitoral a composição fixa dos dois círculos eleitorais da emigração (2 deputados cada), não relevando o número de inscritos para efeitos de actualização da distribuição de deputados pelos diversos círculos. Curiosamente, o actual número de deputados a eleger pelos círculos da emigração acaba por ser proporcional ao número de eleitores. O total de cerca de 160 mil eleitores, elegendo 4 deputados, não se distancia muito dos círculos distritais que elegem igualmente 4 deputados: Bragança tem, actualmente, cerca de 150 mil eleitores e a Guarda cerca de 170 mil. Sucede, no entanto, que os dados da abstenção nos círculos do estrangeiro são extremamente elevados: no círculo da Europa rondam os 72%, enquanto no círculo de Fora da Europa rondam os 80%.

Solução proposta
No quadro das propostas por nós avançadas para delimitação de círculos eleitorais, de todas as soluções possíveis, a mais coerente é a instituição de um círculo parcial único para a emigração, elegendo 2 deputados. Graças ao actual número de eleitores recenseados nos círculos da emigração não é necessário proceder a qualquer ajuste excepcional à dimensão do círculo. No contexto da emigração não fará sentido instituir um círculo uninominal, já que o grau de personalização pretendido praticamente se alcança com o número reduzido de deputados eleitos neste círculo. Como é evidente, não é possível optar pela instituição de dois círculos uninominais em substituição do círculo plurinominal, uma vez que se estaria perante um flagrante violação do princípio da proporcionalidade: a existência de um círculo plurinominal é absolutamente incontornável, mesmo em sede de círculos situados fora do território nacional.
Cada eleitor residente no estrangeiro receberia apenas um boletim de voto, no qual votaria nas listas apresentadas pelos partidos para o círculo parcial. O seu voto seria igualmente contabilizado no apuramento do círculo nacional, como, de resto, é a regra no sistema proposto. O que foi dito a propósito da redução do número de deputados a eleger nos círculos das Regiões Autónomas é igualmente válido nesta sede.

6. Simulações

As simulações que agora apresentamos, baseadas nos resultados eleitorais das três últimas eleições legislativas, visam demonstrar que o sistema proposto não só contribui para o aumento da proporcionalidade, como não afecta a formação de maiorias governativas estáveis. No entanto, como veremos, ambos os modelos podem ser objecto de críticas neste domínio.
Uma vez que os resultados reais de 1999, 2002 e 2005 implicaram a eleição de 226 deputados em território nacional e 4 nos círculos da emigração, e a proposta avançada visa eleger 228 deputados no território nacional e 2 nos círculos da emigração (apesar de se descreverem outras alternativas, mais adiante), procedeu-se à simulação utilizando os resultados da emigração para eleição de apenas 2 deputados.
QUADRO 3 - COMPARAÇÃO COM OS RESULTADOS DE 1999

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No que toca aos resultados eleitorais de 1995 o sistema proposta leva a resultados diversos em termos de estabilidade, uma vez que o partido mais votado perderia a vantagem de deter metade dos deputados à Assembleia da República, e consequentemente, a faculdade de bloquear as iniciativas legislativas da oposição. Sublinhe-se no entanto que essa vantagem resultara, acima de tudo, do resultado eleitoral nos círculos da emigração, onde o princípio da proporcionalidade sofre diversos entorses.

Apesar de perder essa mais-valia, o Partido Socialista, continuaria a só poder ser derrotado pela votação negativa das três principais forças da oposição (PSD, CDU, CDS), cenário parlamentar em tudo idêntico ao da VII Legislatura (1995-1999). Acrescente-se que a referida Legislatura foi uma marco de estabilidade na história do constitucionalismo português do pós-25 de Abril já que, pela primeira vez, um governo minoritário sobreviveu até ao final do seu mandato.

QUADRO 4 - COMPARAÇÃO COM RESULTADOS DE 2002
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Comparados os resultados alcançados nas penúltimas eleições legislativas com as simulações realizadas para as alternativas A e B, constatamos que a maioria parlamentar que sustentava a coligação governamental PSD-CDS ficaria intacta. Aqueles dois partidos contavam com uma bancada de 119 deputados, número esse que permaneceria idêntico em qualquer das alternativas propostas. A diferença reside no peso relativo de cada partido dentro da coligação governamental: o CDS-PP elegeria mais 3 (Alternativa A) ou 4 deputados (Alternativa B), enquanto o PSD perderia precisamente esses mandatos. Face a este números, verifica-se que a governabilidade do país não seria afectada pela proposta.

Do lado da oposição, seria mais uma vez o principal partido (PS) a perder mandatos para os pequenos e médios (CDU e BE). Fica também cabalmente demonstrada a inexistência de perigo de pulverização da representação parlamentar, já que o mais pequeno partido, o Bloco de Esquerda, apenas nos quadros da Alternativa B conseguiria aumentar a sua representação, em apenas um mandato.

QUADRO 5 - COMPARAÇÃO COM RESULTADOS DE 2005
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Finalmente, vejamos a situação face ao último acto eleitoral. Introduzidos os resultados eleitorais obtidos pelas forças políticas concorrentes em 2005, constatamos que o quadro de representação parlamentar sofre consideráveis alterações.
Em primeiro lugar, quanto à Alternativa A, cumpre destacar a manutenção da maioria absoluta do Partido Socialista, aspecto relevante na análise do factor estabilidade. Contudo, o modelo proposto conduz a uma resultado chocante de uma perspectiva do funcionamento da proporcionalidade: a obtenção pelo CDS-PP de maior número de deputados do que a coligação PCP-PEV, que obteve mais votos expressos. A concentração do eleitorado do CDS em círculos em que lhe é possível fazer um melhor aproveitamento dos restos, por um lado, associada aos bons resultados do Bloco de Esquerda, beneficiando em alguns dos círculos hipotéticos de melhor implantação para efeitos de aproveitamento dos restos com prejuízo para o PCP-PEV, por outro auxiliam a compreender o resultado. A estes factores acresce ainda o resultado próximo das votações nos dois partidos, separados apenas por cerca de 17 mil votos. Curiosamente, apesar do resultado comparado entre estes dois partidos revelar um claro efeito contrário à proporcionalidade, o modelo aponta para uma melhoria global do índice de proporcionalidade (vide infra). A entorse verificada é igualmente susceptível de ocorrer nos quadros do sistema actual, em caso de melhor aproveitamento de restos ou de mudança de padrões eleitorais (o que se verificou parcialmente em 2005, com a passagem do Bloco de Esquerda para à frente do PCP-PEV em diversos círculos.
Quanto à alternativa B, ao mesmo tempo que contribui para melhorar a proporcionalidade (não produzindo resultado desproporcional comparativo entre PCP-PEV e CDS) priva o Partido Socialista da sua maioria absoluta, forçando-o à negociação com outras forças políticas. Sublinhe-se, porém, que a correlação de forças políticas determina uma vez mais que apenas a combinação de toda a oposição é suficiente para ultrapassar a maioria governamental.
A utilização destes dados no modelo revelaria ainda a curiosidade da eleição de um deputado pelo PCTP/MRPP, através do círculo nacional, trazendo um novo partido à Assembleia da República.
Finalmente, em termos de índices de propocionalidade[1], da comparação dos resultados oficias com as simulações realizadas para as duas alternativas do sistema proposto resultam os dados referidos no seguinte quadro:

QUADRO 6 – ÍNDICES DE PROPORCIONALIDADE

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7. Conclusão
Procurámos ao longo desta proposta desenvolver uma série de contributos para uma discussão futura sobre a reforma do sistema eleitoral para a Assembleia da República. Optámos por não nos limitar ao objectivo da personalização da relação eleito-eleitor, preferindo dar igual relevo à necessidade de melhorar os índices de proporcionalidade do sistema. Não se tratou tanto de encontrar soluções originais para os problemas levantados pela reforma, mas antes de conjugar vários elementos para ultrapassar dificuldades pontuais. O resultado final parte do modelo apresentado pelo XIII Governo Constitucional em 1998, dando um maior relevo ao círculo nacional e à necessidade de desenhar um novo mapa eleitoral, atendendo às exigências do sistema.
No que toca à articulação dos círculos uninominais com os círculos plurinominais (parciais e nacional), esperamos ter conseguido encontrar uma solução viável para ultrapassar a proibição de existência de mandatos supranumerários. A verificação da segunda volta nos moldes propostos será tão rara, que não afectará o funcionamento do escrutínio final.
As principais reservas a algumas das sugestões defendidas colocar-se-ão, provavelmente, ao nível da governabilidade. Terá o sistema eleitoral um impacto negativo no funcionamento do sistema político? As simulações efectuadas podem apontar nesse sentido. Se através do aumento dos níveis de proporcionalidade de forma a beneficiar os pequenos e médios partidos, o sistema continua a produzir o mesmo tipo de maiorias e minorias parlamentares (caso de 1999 e 2002), casos há em que torna mais difícil a maioria absoluta de partido único (modelo B em 2005). Contudo, a intenção da proposta é precisamente essa: salvaguardar o multipartidarismo e obstar à bipartidarização completa do xadrez político português, gerador de potenical dano ao pluralismo político.

[1] Adoptando o critério de Richard Rose, ROSE (Sistemas eleitorais: Uma questão de grau ou de princípio? in Sistemas eleitorais – O Debate Científico op.cit. págs. 214 segs.), seguido igualmente por FERNANDO ROCHA ANDRADE (op. cit.). Calcula-se o índice através da soma da diferença entre a quota de assentos parlamentares e a quota percentual de votos de cada partido, dividida por 2 e subtraída de 100. A proporcionalidade será tanto maior, quanto o índíce se aproximar de 100.
[1] Parecer (FDUC) in Parecere, Pareceres sobre o anteprojecto de reforma eleitoral para a Assembleia da República, Presidência do Conselho de Ministros et. al. (org.) 1998s op. cit. págs. 32-33
[2] Parecer (FDUCP) in Pareceres op. cit. pág. 699
[3] Esta é também a opinião expressa no parecer da Universidade Católica Portuguesa, que vai mesmo ao ponto de defender que a principal voação do círculo eleitoral nacional deve ser permitir a eleição desses candidatos (Parecer (FDUCP) in Pareceres op. cit. págs 701-702)
[4] FERNANDO ROCHA ANDRADE, Tentando a Quadratura do Círculo – Uninominalidade e garantia de proporcionalidade no sistema eleitoral para a Assembleia da República – extracção parcial de estudo solicitado pelo Ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública, in Revista Eleições nº 6
[5] Por exemplo, o círculo do Norte, na proposta B.
[6] Por exemplo, os círculos Lisboa Urbana e Porto Urbano na proposta A. Quanto ao círculo a instituir em torno da capital, apesar de não termos desenvolvido essa hipótese, seria ainda perfeitamente lógica a agregação de municípios das duas marges no rio Tejo, configurando um círculo próximo dos limites da Área Metropolitana de Lisboa.
[7] Por exemplo, o círculo do Centro Litoral, na proposta A, construído a partir de municípios dos distritos de Coimbra, Leiria e Aveiro.
[8] Na proposta A, o círculo mais pequeno elege 8 deputados e os maiores elegem 12 deputados. Na alternativa B, o círculo mais pequeno elege 18 deputados, enquanto os maiores elegem 24.
[9] O famoso caso do “orçamento do queijo”, de contornos queirozianos, mas bem real às portas do séc. XXI.
[10] Não nos esqueçamos de que se trata de círculos uninominais de candidatura, não de apuramento.
[11] cfr. Parecer (FDUCP) in Pareceres op cit. pág. 701
[12] Adoptamos o critério da lei alemã e do Anteprojecto do XIII Governo Constitucional (a proposta de lei apontava para os 20%).
[13] A proposta de lei procedia a este cálculo ao nível do círculo parcial, mas como referimos anteriormente, optámos por inverter a sequência das operções.
[14] À semelhança, aliás, do que sugerimos para os círculos de pequena dimensão na actual legislação eleitoral, caso não se avance com a reforma.

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