Foi ontem a anteestreia do novo filme de António Pedro Vasconcelos «Call Girl», com argumento de Tiago Reis Santos. Deixo em pequeno depoimento do argumentista, justo depois do primeiro screening do filme (que, por acaso era para ter ido - assimo como à anteestreia de ontem - e agora só à estreia oficial, dia 27...)
Retirado do blogue de João Nunes
Depoimento: Tiago Santos e a escrita de “Call girl”
Publicado em 26 de Setembro de 2007 por João Nunes
Depoimento: Nuno Duarte e a escrita de "O Turno da Noite"
Depoimento: Tiago Santos e a escrita de "Call girl"
O Tiago Santos é o segundo convidado desta série especial de depoimentos de guionistas. Como se diz dos futebolistas, o Tiago está a atravessar um bom momento de forma. Os três últimos guiões em que trabalhou receberam luz verde: "Atrás da nuvens", que já estreou este ano; "Call girl", que é um dos filmes mais aguardados da rentrée; e "Star Crossed", que vai entrar em breve em rodagem. Lendo as suas palavras é fácil perceber porquê.
Putas, Polícias e Políticos: a origem de "Call Girl"
Vi uma segunda montagem do ‘Call Girl’ há poucos dias atrás. Em casa de António-Pedro Vasconcelos (APV), estávamos acompanhados pela sua esposa e a minha irmã. As imagens e os diálogos ainda não acompanhados por música passavam num ecrã plasma. Se a minha vida fosse um filme (não é, é muito mais aborrecida do que isso), este era o momento perfeito para um flashback. ‘Close up’ na cara do argumentista, um sorriso enigmático, fade to black.
(só agora é que percebi que, se a minha vida fosse um filme, aparentemente era bastante mal realizado)
Conheci o APV poucos meses depois de voltar de Nova Iorque, onde durante dois anos e meio escrevi, estudei, trabalhei em restaurantes e me envolvi no mais variado tipo de confusões. Agora em Lisboa, este jovem argumentista de 27 anos não fazia a mais pequena ideia de como entrar na indústria.
(sim, era também ingénuo ao ponto de acreditar que existia uma indústria)
Com Miguel Meneses, um amigo actor que tinha frequentado um workshop dado pelo APV, começámos a trabalhar numa ideia para um filme que lhe apresentariamos mais tarde. Chamava-se ‘Diana’. Escrevemos sinopse, descrição de personagens, pitch e cenas dialogadas. Alguns dias depois, APV telefona e combina um almoço num restaurante italiano no Bairro Alto.
(o primeiro de dezenas de almoços e jantares em restaurantes italianos com o APV: o homem gosta da sua pizza)
Sempre simpático, enquanto comia Linguini com ameijoas com cuidado para não manchar a camisa, APV disse-nos que não estava interessado no projecto.
(Primeiro conselho para guionistas: habituem-se à rejeição. Porque depressa se vai tornar parte do vosso dia a dia)
Eu tentei disfarçar a desilusão com um sorriso e, como quem não quer nada, ofereci-lhe uma cópia do ‘Strange Everyday People’ , um guião em Inglês que tinha escrito um ano antes.
(Segundo conselho para guionistas: tenham sempre um plano B, tenham sempre algo mais para mostrar, se somos escritores, é isso que as pessoas esperam de nós: coisas escritas, muitas, várias, ideias, frases, conceitos)
Uma semana depois, recebo um email entusiasta: ‘muito interessante’, ‘personagens cheias de defeitos mas pelas quais temos simpatia’, ‘tenho uma ideia que gostava de discutir contigo. Chama-se ‘Call Girl’. Seguiram-se três anos de trabalho, a saída do Miguel Meneses do projecto, inúmeras versões, a derrota num concurso do ICAM, períodos de entusiasmo, fases de derrotismo.
(Terceiro conselho para guionistas: se estão a trabalhar na ideia de outros, não esperem facilidades. As pessoas têm dificuldade em reconhecer as suas próprias ideias quando estas são traduzidas pelos outros. Não desistam facilmente e encontrem escapatórias para a frustação: alcóol e drogas costumam ajudar)
Até que chegámos ao dia de início das filmagens. Produção MGN, Soraia Chaves como Maria, Ivo Canelas como Madeira, Nicolau Breyner como Meireles. A puta, o polícia e o político, que durante tanto tempo viveram apenas na imaginação de escritor e realizador, estavam agora à minha frente. Primeiro durante a rodagem, no trabalho dos actores e de toda a equipa de produção, depois naquele ecrã plasma, onde já não pertencem a ninguém e simplesmente existem. E, enquanto vejo o filme, a forma como está realizado, fotografado, interpretado, iluminado e decorado, tenho a sorte e satisfação de dar por mim a pensar
How the fuck did this happen? ‘Call Girl’ wasn’t this good on paper.
(quando falo comigo próprio, mesmo em conversas mentais, faço-o sempre em Inglês. Acho que me torna mais ‘cool’. Estão a ver? Eu disse Cool. Acabei de o fazer outra vez)
Tiago R. Santos trabalhou no guião de Atrás das Nuvens e Call Girl, nos cinemas a 29 de Novembro. Escreveu também, em conjunto com Artur Ribeiro, o PICA, defunta série da Dois cuja versão cinematográfica entra hoje em produção. E, junto com Neil Jackson, assina ‘Star Crossed’, cuja rodagem tem início em Outubro no Porto.
Publicado em 26 de Setembro de 2007 por João Nunes
Depoimento: Nuno Duarte e a escrita de "O Turno da Noite"
Depoimento: Tiago Santos e a escrita de "Call girl"
O Tiago Santos é o segundo convidado desta série especial de depoimentos de guionistas. Como se diz dos futebolistas, o Tiago está a atravessar um bom momento de forma. Os três últimos guiões em que trabalhou receberam luz verde: "Atrás da nuvens", que já estreou este ano; "Call girl", que é um dos filmes mais aguardados da rentrée; e "Star Crossed", que vai entrar em breve em rodagem. Lendo as suas palavras é fácil perceber porquê.
Putas, Polícias e Políticos: a origem de "Call Girl"
Vi uma segunda montagem do ‘Call Girl’ há poucos dias atrás. Em casa de António-Pedro Vasconcelos (APV), estávamos acompanhados pela sua esposa e a minha irmã. As imagens e os diálogos ainda não acompanhados por música passavam num ecrã plasma. Se a minha vida fosse um filme (não é, é muito mais aborrecida do que isso), este era o momento perfeito para um flashback. ‘Close up’ na cara do argumentista, um sorriso enigmático, fade to black.
(só agora é que percebi que, se a minha vida fosse um filme, aparentemente era bastante mal realizado)
Conheci o APV poucos meses depois de voltar de Nova Iorque, onde durante dois anos e meio escrevi, estudei, trabalhei em restaurantes e me envolvi no mais variado tipo de confusões. Agora em Lisboa, este jovem argumentista de 27 anos não fazia a mais pequena ideia de como entrar na indústria.
(sim, era também ingénuo ao ponto de acreditar que existia uma indústria)
Com Miguel Meneses, um amigo actor que tinha frequentado um workshop dado pelo APV, começámos a trabalhar numa ideia para um filme que lhe apresentariamos mais tarde. Chamava-se ‘Diana’. Escrevemos sinopse, descrição de personagens, pitch e cenas dialogadas. Alguns dias depois, APV telefona e combina um almoço num restaurante italiano no Bairro Alto.
(o primeiro de dezenas de almoços e jantares em restaurantes italianos com o APV: o homem gosta da sua pizza)
Sempre simpático, enquanto comia Linguini com ameijoas com cuidado para não manchar a camisa, APV disse-nos que não estava interessado no projecto.
(Primeiro conselho para guionistas: habituem-se à rejeição. Porque depressa se vai tornar parte do vosso dia a dia)
Eu tentei disfarçar a desilusão com um sorriso e, como quem não quer nada, ofereci-lhe uma cópia do ‘Strange Everyday People’ , um guião em Inglês que tinha escrito um ano antes.
(Segundo conselho para guionistas: tenham sempre um plano B, tenham sempre algo mais para mostrar, se somos escritores, é isso que as pessoas esperam de nós: coisas escritas, muitas, várias, ideias, frases, conceitos)
Uma semana depois, recebo um email entusiasta: ‘muito interessante’, ‘personagens cheias de defeitos mas pelas quais temos simpatia’, ‘tenho uma ideia que gostava de discutir contigo. Chama-se ‘Call Girl’. Seguiram-se três anos de trabalho, a saída do Miguel Meneses do projecto, inúmeras versões, a derrota num concurso do ICAM, períodos de entusiasmo, fases de derrotismo.
(Terceiro conselho para guionistas: se estão a trabalhar na ideia de outros, não esperem facilidades. As pessoas têm dificuldade em reconhecer as suas próprias ideias quando estas são traduzidas pelos outros. Não desistam facilmente e encontrem escapatórias para a frustação: alcóol e drogas costumam ajudar)
Até que chegámos ao dia de início das filmagens. Produção MGN, Soraia Chaves como Maria, Ivo Canelas como Madeira, Nicolau Breyner como Meireles. A puta, o polícia e o político, que durante tanto tempo viveram apenas na imaginação de escritor e realizador, estavam agora à minha frente. Primeiro durante a rodagem, no trabalho dos actores e de toda a equipa de produção, depois naquele ecrã plasma, onde já não pertencem a ninguém e simplesmente existem. E, enquanto vejo o filme, a forma como está realizado, fotografado, interpretado, iluminado e decorado, tenho a sorte e satisfação de dar por mim a pensar
How the fuck did this happen? ‘Call Girl’ wasn’t this good on paper.
(quando falo comigo próprio, mesmo em conversas mentais, faço-o sempre em Inglês. Acho que me torna mais ‘cool’. Estão a ver? Eu disse Cool. Acabei de o fazer outra vez)
Tiago R. Santos trabalhou no guião de Atrás das Nuvens e Call Girl, nos cinemas a 29 de Novembro. Escreveu também, em conjunto com Artur Ribeiro, o PICA, defunta série da Dois cuja versão cinematográfica entra hoje em produção. E, junto com Neil Jackson, assina ‘Star Crossed’, cuja rodagem tem início em Outubro no Porto.
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