segunda-feira, julho 03, 2006

Lei das Finanças Locais

Este fim-de-semana, mais propriamente no Domingo, e levado pela euforia do jogo de Sábado, saí numa frenética busca de jornais desportivos, percorri todo o Bairro Alto, do Chiado ao Príncipe Real, e só encontrei banca aberta na Calçada do Combro (e esta por um par de minutos). Tudo o resto fechado.
[Será que não há vida pública aos domingos. Bom, não interessa.]

Lá comprei «A Bola» e o «Record» (sim, que em dia pós jogo toda a informação é pouca, mesmo que venha em doses brutais e repetida), e aproveitei para também comprar o Expresso. Já não comprava o jornal-do-saco-de-plástico há uns bons meses, e em boa hora o fiz. Comprei-o para ler a entrevista ao Freitas do Amaral (fraca) e para ver como é que estava o jornal. A boa surpresa foi que o jornal está bem melhor, com um interessantíssimo caderno cultural (a Actual) com um conteúdo bem mais desenvolvido e com uma refrescada revista. Vemos que a ameaça de concorrência obriga à renovação.

Dentro dos cadernos que se conseguem ler (o central e a Economia) retirei este óptimo artigo do Nicolau Santos, sobre a nova Lei das Finanças Locais, que subscrevo na íntegra. Reproduzo:

«A LEI das Finanças Locais que se encontra em vigor e muito pouco solidária, fomenta a irresponsabilidade, estimula a pressão urbanística e incentiva a criação de empresas municipais por motivos que podem não ser os mais nobres.
É pouco solidária com o todo nacional porque quanto mais aumentam os impostos para combater o défice, mais receitas são transferidas para as autarquias, já que estas recebem uma percentagem indexada à cobrança dos impostos nacionais. Logo, enquanto se corta no Estado central e se esvazia o bolso dos contribuintes, os municípios ficam com mais dinheiro para fazer mais despesa. Não faz sentido.
Fomenta a irresponsabilidade porque os autarcas só têm o lado bom da coisa pública: gastam ou investem o dinheiro, mas não têm a responsabilidade de o cobrar. São avaliados pela obra que apresentam. Mas não têm o ónus de decidir aumentos da carga fiscal sobre os munícipes para fazer mais um pavilhão gimnodesportivo, uma piscina ou uma nova rotun­da. Não é aceitável.
Depois, muitos dos crimes urbanístico cometidos no país foram estimulados pela lei das Finanças Locais: quanto mais construção mais receitas próprias o município obtêm para juntar às transferências do Fundo de Equilíbrio Financeiro. E quanto mais obra os municípios fizeram, mais construção tiveram de autorizar pa­ra subir as receitas. Não se pode continuar nessa via.
Finalmente, nos últimos anos as empresas municipais têm medrado como cogumelos, umas por bons motivos, mas outras possivelmente pelos maus, já que muitos autarcas passaram a integrar os respectivos conselhos de administração, acumulando os concomitantes ordenados. Ou seja, os autarcas não só decidem criar empresas municipais, como escolhem ser eles próprios a gerir.
Perante isto, a nova Lei das Finanças Lo­cais, apresentada pelo Governo, vai no bom sentido, tentando desatar alguns destes nós. As autarquias passam a receber parte do IRS cobrado nos respectivos concelhos, podendo jogar com uma parcela variável de 3%, pelo que podem cobrar um máximo de 5% ou um mínimo de 2%. Estimula-se assim a concorrência fiscal entre os municípios e responsabiliza-se os autarcas pelo aumento ou diminuição dos impostos sobre os seus munícipes.
São introduzidos diversos factores de correcção das transferências que vão levar a que os apertos fiscais, quando chegam, sejam para todos, Estado central e administração local. O mesmo acontece com a fúria urbanística, que deverá ser atenuada através de novos mecanismos de distribuição dos impostos municipais para concelhos com menos receitas. E os autarcas deixam de poder acumular funções e orde­nados em empresas municipais.
A nova Lei das Finanças Locais não é perfeita e pode ser melhorada. Mas vai claramente no sentido de corrigir uma realidade que tem tido várias manifestações perversas nos últimos 30 anos. Por isso, merece ser apoiada, O caminho e este.»


Nicolau Santos, Expresso 1 de Julho 2006

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