segunda-feira, agosto 11, 2008

Os Muros



I. O Muro entre o Ocidente e a Rússia começou a ruir em 1989. Nunca caíu completamente, antes ressurgiu, aqui e ali, com ferocidade e sangue, por mãos que querem controlar o petróleo e o gás. Está agora a ser re-erguido na Ossétia, com violentos "efeitos colaterais". Ao que parece, as mortes de "civis" devem-se a brutais bombas imperialistas russas.

Já é tempo de chamar pelo nome todos os bois : czaristas ou soviéticos, os russos foram e continuam a ser, também, imperialistas. Bebé e água do banho têm a mesma fonte e ambos à fonte devem voltar. E que esta seja eternamente bem guardada por um dragão. Talvez chinês, porque não?

O imperialismo atlântico, o único a ser nomeado pelos adoradores do Humanité, não está só, nunca esteve só, mas muito bem acompanhado, ombro a ombro, ao longo do longo século XX, por um rival à altura. A frase-chave é " a luta continua!" e poliniza-se com os sopros dos ventos de Leste, aqueles que, na literatura romântica, ensandeciam as gentes, sobreudo os homens, apaixonados sem esperança, algo tísicos e perante espectros de Morte próxima. O coro da música única, minimal e repetitiva, aplaudiu, sempre, a disseminação dos ódios abstractos.

Como nas relações amorosas intensas e trágicas (felizmente trágicas, porque com ponto final!) ambos os gigantes lutaram ferozmente. Nenhum esmurrou um ser imaginário. Inversamente, a tragédia da Humanidade está no sem fim do combate, agravado pela finitude dos recursos naturais, nomeadamente energéticos e de água potável.

II. Um outro Muro é evocado, na recém inaugurada exposição no Museu Britânico, sobre Adriano, o gigante de Roma, o Muro que na Grande Britânia delimitava a norte o Império Romano "protegendo-o das invasões dos guerrilheiros escoceses". O mesmo homem da obra de Marguerite Yourcenar "Mémoires d´Hadrien", arquitecto de um vasto Império, com um território da Itália à Geórgia e de Israel a Newcastle e muito mecenato artístico. O grande homem era ditatorial e sensível às belas-artes.

III. Comparando geografias políticas de uma e de outra época (o Império Romano com os actuais Impérios em decadência e beligerância) o mapeamento das zonas em conflito é estranhamente coincidente: as guerras de então nos mesmos lugares das guerras de hoje. Não é uma fatalidade mas uma constatação a merecer reflexão.

IV. Não há, ontem como hoje, muros e muros. Há um Muro. Na fronteira USA/México, em Israel, no Afeganistão ou na Directiva sobre Emigração, de pedra, arame electrificado, de sangue ou vestido de Norma, é sempre o mesmo Muro, com diversas epifanias. Avatares, dir-se-á hoje, ie, epifanias sem transcendência. Tanto melhor. Haverá mãos humanas (quais?) capazes de pôr fim à Macabra Dança do Muro! Recuso-me a acreditar em fatalidades antropológicas e, como eu, muitas outras pessoas que, também como eu, não professamos determinismos sócio-económicos.

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