sexta-feira, agosto 03, 2007

Polémica na Cultura II


Parece que o episódio da Dalila Rodrigues está aí para aquecer a silly season. Pelo menos aqui, aqui, e aqui já vi comentários ao acontecido. Também aqui já opinei, se bem que de leve, sobre o que pensava sobre o tratamento jornalístico dado à situação.
Quero, agora, acrescentar algumas reflexões.
1. Continuo a defender que não estamos perante nenhuma exoneração ou despedimento. A entidade tutelar do MNAA decidiu, com legitimidade, não reconduzir a Dalila no cargo de directora do Museu. É o Ministério da Cultura que tem e define o critério para a recondução ou não dos directores dos museus à sua tutela. Não podemos, com certeza, esperar que o cargo de directora da MNAA seja pessoal e intransmissível, e que a Dalila permaneça no lugar enquanto ela decidir. Não, quem decide é o Ministério. Aqui não há discussão.
2. Agora, põe-se em causa dois problemas: o do critério de avaliação e o da qualidade das políticas culturais.
3. Sobre a avaliação, a Ministra, se quer ser tomada como séria, tem de assumir publicamente o porquê da não recondução de Dalila no cargo. Repare-se que a Ministra da Cultura pode adiantar uma série de considerações legítimas e aceitáveis, desde a quebra de confiança, à mudança de política no Ministério, etc. Não pode é, no meu ponto de vista, ficar calada. Tem de se expor ao escrutínio e à responsabilização. Qualquer Estado democrático avançado é confrontado com as suas decisões políticas. Tem de ser normal e natural que os Ministros expliquem as suas decisões, não numa lógica desculpatória, mas numa atitude responsabilizadora, transparente e activa. Só assim pode a política sair da penumbra dos gabinetes, das decisões escondidas e das suspeita caciquista.
4. A Ministra da Cultura tem toda a legitimidade de ter feito o que fez. Tem é que o assumir, e acartar com a responsabilidade dos seus actos, para o bem e para o mal.
5. Depois há a questão da política cultural seguida por este ministério e este governo. E aqui há muito que criticar. Mas, atenção, a crítica não vem de agora, não é exclusiva a este executivo, nem atinge apenas as políticas culturais do Estado português. A verdade é que não temos política cultural no nosso país. Nem no Estado, nem nas Câmaras. Este é que deveria ser o verdadeiro debate. E neste ponto não vejo intervenções políticas nem «reportagens jornalísticas».
6. Não se entende como é que as Instituições culturais deste país não tem autonomia - artística, financeira e pedagógica – para poderem se desenvolver. Sabemos que para se desenvolver um projecto institucional são necessários vários anos, décadas mesmo, e não é com a permanente instabilidade da incerteza das direcções que se consegue a tal linha coerente que permita o desenvolvimento, crescimento e cimentação das nossas principais instituições culturais (e este é um ponto a favor da permanecia da Dalila).
7. Agora, não chega a estabilidade. Tem de haver objectivos, patamares a alcançar. Tem de haver a capacidade de avaliação do trabalho, e aí poderem ser assumidamente confrontadas as responsabilidades dos diversos promotores culturais, desde directores a chefes de divisão, a secretários de Estado e à próprio titular do cargo da Cultura. E voltamos ao problema da avaliação. Como se faz, quem a assume, quem a defende, quem se responsabiliza.
8. Depois há ainda o problema da centralidade administrativa. Há, geneticamente, neste país, um forte controlo centralista, que alguns – populistas – querem chamar de estalinista e colar à imagem deste governo. Pois este executivo não é diferente do anterior, como não é diferente da antiga governação da CML (para dar dois exemplos) na relação com a descentralização responsabilizada. Não a prática. Ponto. Como não descentralizava Carmona Rodrigues a relação com as Bibliotecas e Museus da cidade de Lisboa. Como não o fazia Pedro Roseta.
9. O problema é do Estado. Do sistema. Porque não confia, não descentraliza, não responsabiliza. Esta é o verdadeiro debate. Não o fait divers da Dalila Rodrigues, independentemente dos méritos que a senhora tenha.
10. Também todo o trabalho que CCB tinha feito nos últimos 10 anos foi deitado ao lixo com a birra do Berardo, e poucos se importaram; também todo o departamento cultural da CML deixou de existir nos últimos anos, e também poucos se importaram.
11. Estamos perante um puro aproveitamento político populista e demagógico de uma situação paralela. Que se debata o que importa, não o que enche o olho.

Sem comentários:

Pesquisar neste blogue