Chamada para artigos
Cadernos de Estudos Africanos
N.º Especial (Dezembro 2006)
“Memórias cinzentas: reconstruções dos passados coloniais em África e na Europa”
A revista Politique Africaine irá lançar em Junho de 2006 um número especial sobre memórias coloniais, dando particular atenção às formas como essas memórias (frequentemente reconstruídas) servem determinados objectivos políticos, incluindo políticas públicas concretas. Aquela revista tinha já publicado duas contribuições iniciais para o tema (veja-se o n.º 98, de Junho de 2005), pela mão de Pierre Boilley (“Loi du 23 Février 2005, colonisation, indigènes, victimisations”. Évocations binaires, répresentations primaires») e Jean-Pierre Chrétien (“Le passé colonial: le devoir d’Histoire”). O primeiro texto examinava os debates em torno do art. 4.º da lei de 23 de Fevereiro do ano passado, que estabelece que nas escolas os alunos devem ser instruídos sobre o papel positivo da colonização francesa além-mar. O segundo analisava o passado colonial através da lente do “dever histórico”, com alusões ao debate belga sobre a colonização e as suas manifestações recentes (por exemplo, a exposição do Museu de Tervuren, «Mémoires du Congo au temps colonial», catálogo impresso de 2005 e informação disponível em www.congo2005.be).
Cadernos de Estudos Africanos
N.º Especial (Dezembro 2006)
“Memórias cinzentas: reconstruções dos passados coloniais em África e na Europa”
A revista Politique Africaine irá lançar em Junho de 2006 um número especial sobre memórias coloniais, dando particular atenção às formas como essas memórias (frequentemente reconstruídas) servem determinados objectivos políticos, incluindo políticas públicas concretas. Aquela revista tinha já publicado duas contribuições iniciais para o tema (veja-se o n.º 98, de Junho de 2005), pela mão de Pierre Boilley (“Loi du 23 Février 2005, colonisation, indigènes, victimisations”. Évocations binaires, répresentations primaires») e Jean-Pierre Chrétien (“Le passé colonial: le devoir d’Histoire”). O primeiro texto examinava os debates em torno do art. 4.º da lei de 23 de Fevereiro do ano passado, que estabelece que nas escolas os alunos devem ser instruídos sobre o papel positivo da colonização francesa além-mar. O segundo analisava o passado colonial através da lente do “dever histórico”, com alusões ao debate belga sobre a colonização e as suas manifestações recentes (por exemplo, a exposição do Museu de Tervuren, «Mémoires du Congo au temps colonial», catálogo impresso de 2005 e informação disponível em www.congo2005.be).
No início de 2006, no seio do Africa-Europe Group of Interdisciplinary Studies, que agrega vários centros de investigação europeus de estudos africanos, surgiu a ideia de promover uma maior ligação e cooperação entre as respectivas revistas, nomeadamente através da publicação de números temáticos afins. O Centro de Estudos Africanos (CEA-ISCTE, Lisboa) aceitou o repto e propõe-se publicar no final de 2006 um número especial dos seus Cadernos de Estudos Africanos sobre memórias coloniais.
As interrogações dos colegas da revista Politique Africaine (vd. http://www.politique-africaine.com/appels/memoires_grises.pdf) servem-nos de guia e ajudam-nos a formular novas questões para os casos português e das suas antigas colónias em África. Se em França frequentemente se diagnostica uma “fractura colonial”, em Portugal tal não será evidente. No campo político e na opinião pública portuguesa não se regista propriamente um debate sobre o passado colonial. Regra geral, faz-se uma avaliação positiva da história de Portugal e do colonialismo português, para o que concorre certamente uma certa retórica luso-tropical muito vulgarizada. O «fim do império» é que, a espaços, irrompe como um problema mal resolvido. O partido mais à direita no espectro parlamentar (CDS-PP) tem sido porta-voz de algumas reivindicações dos chamados “Espoliados do Ultramar”. Além disso, entre uma parte significativa da população portuguesa, sobretudo a que regressou à antiga metrópole após a independência das ex-colónias, faz-se um juízo negativo sobre a forma como se procedeu à descolonização (não obstante a rápida e bem sucedida integração do meio milhão de retornados na sociedade portuguesa).
Pouco tempo depois do «regresso das caravelas», grupos de retornados (da mesma localidade de Angola ou Moçambique ou da mesma empresa colonial) começaram a reunir-se em confraternizações anuais (almoços, piqueniques), numa lógica de cíclica ‘revisitação’ de um local de saudade. Recentemente, temos assistido a uma ‘avalanche’ de memórias sobre África na imprensa, no audiovisual, na produção editorial, na Internet. Verifica-se uma apetência crescente por tudo o que tem a ver com as antigas colónias portuguesas. Parece haver uma urgência de convocar essas memórias, mesmo da parte das gerações mais novas que saíram de África com poucos anos de idade ou que já nasceram depois das independências.
Nas antigas colónias, por seu turno, não parece haver uma forte tensão e/ou oposição às memórias veiculadas pela antiga potência colonial. Os governos dos países independentes não terão pejo de usar, em função de agendas próprias, o discurso da irmandade linguística, cultural e histórica. Acresce que em Angola e Moçambique, devido à guerra civil e à vigência de regimes de partido único após a independência, as memórias dos conflitos mais recentes sobrepõem-se às memórias do período tardo-colonial. De forma perversa, e em aspectos concretos (acesso ao mercado, dinamismo da economia, segurança, infra-estruturas), a comparação pode até ‘beneficiar’ o balanço que é feito do domínio colonial. Convém, no entanto, perscrutar com mais pormenor os meandros desses processos de reconstrução da memória do colonialismo e perceber como são recordados alguns dos seus aspectos mais gravosos: o trabalho forçado, o esbulho de terras, as culturas obrigatórias, a discriminação de estatuto jurídico.
O objectivo deste número especial é reunir contribuições que clarifiquem, de forma original e plural, a reconstrução da memória do passado colonial. Serão bem-vindos textos que se ocupem dos seguintes problemas:
1) processos em curso de (re)construção da memória colonial na antiga metrópole (se possível em perspectiva comparada com outras antigas metrópoles coloniais, como a França, a Bélgica, a Grã-Bretanha, a Alemanha e a Itália);
2) políticas da memória (monumentos, museus, comemorações, manuais escolares) relativamente ao passado colonial em África e/ou na Europa;
3) emergência e/ou reabilitação de espaços (virtuais ou físicos) de memória colonial (sítios, blogues e fóruns de discussão na Internet, realização de encontros, confraternizações, piqueniques que reúnem ‘retornados’);
4) relação com certos produtos culturais e mediáticos criados na antiga metrópole (como, por exemplo, a RDP-África e a RTP-África e da telenovela da TVI «A Jóia de África», ambientada em Moçambique, clubes portugueses de Futebol);
5) reconstrução da memória dum passado colonial brutal (reflexão sobre os massacres, a violência física, o trabalho forçado, as guerras coloniais, etc.);
6) reconfigurações da memória da contestação ao colonialismo e das lutas de libertação nacional pela independência de Angola, Guiné e Moçambique.
Indicações práticas:
O número especial será publicado em Dezembro de 2006. Aceitam-se propostas (c. 1 página) de artigos originais até 31 de Maio. Em meados de Junho de 2006, os coordenadores e os autores reunir-se-ão para discutir os conteúdos do n.º especial. Os artigos, na sua versão integral, em português, francês ou inglês (máximo 50.000 caracteres) devem ser enviados até 30 de Setembro, para os endereços electrónicos dos coordenadores.
Coordenadores:
Pedro Aires Oliveira (mpoliveira@fcsh.unl.pt) e Cláudia Castelo (claudiacastelo@clix.pt)
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