quinta-feira, junho 11, 2009

Crónica de uma eleição europeia (I) [título modificado]

48 horas depois já consigo proferir um par de análises sobre o 7 de Junho. Irei faze-lo em jeito de crónica e em posts distintos: um prelúdio, um par de ideias sobre as eleições e uma ou duas reflexões sobre o futuro.
Prelúdio: Bruxelas, 7 de Junho.
O dia 7 de Junho começou de forma fantástica. Viagem para Bruxelas em primeira (deram-me um update de ultima hora, que aceitei) e no lugar ao lado do do Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso. Acabei por trocá-lo com o João Marques de Almeida – não me fosse eu não me comportar– mas ir para Bruxelas com Bruxelas pintou de excentricidade a viagem e permitiu alargar a palete de cores do meu dia. Vinha vestido de vermelho, puro; e agora uns tons de azuis apresentavam-se institucionalmente.
Chegado a Bruxelas, ao Parlamento Europeu, a atmosfera era a dos grandes jogos. Centenas de jornalistas, vários estúdios de televisão e da rádio, entrevistas por todo o lado. Uma energia contagiante. Gente e mais gente, encontrões, olhares cruzados, piadas e risos. Stress. Muito stress. Mais cores apareceram. Verde, Amarelos, tons de Vermelho e de Azul, Cinzas. Todas as cores do espectro político europeu visíveis ao olho nu. A democracia vestida com o seu melhor traje. Fantástico cenário.
No Partido Socialista Europeu a noite não era a das grandes vitórias. O semblante carregado do staff não nos deixava grandes esperanças, e o vislumbre dos primeiros resultados confirmava as piores expectativas. Esperava-se perder nos grandes países e de uma maneira geral um pouco por todo o lado. Mas quando se começou a perceber o que se ia passar em França, na Alemanha, na Polónia, na Hungria a ideia inicial de fazer um bom jogo, de nos apresentarmos competitivos, de podermos – de alguma maneira – moldar a nova Europa eleita (condicionando, por exemplo, a eleição de Barroso), rapidamente desvaneceu. Agora era evitar a goleada, e procurar promover as pequenas vitórias na segunda divisão da política europeia (Grécia, Belgica, Malta, Dinamarca, Chipre, mais tarde a Roménia, etc). Afinal, os partidos membros do PES subiram em 10 dos 27 países.
Esperávamos perder, mas nunca de goleada, nunca assim. Nunca tão cedo. E perdemos Portugal. E perdemos Espanha. Caímos nos bastiões do socialismo progressista europeu que são o exemplo da governação social-democrata para essa Europa de esquerda. Desastre. Massacre. Afinal, até tínhamos uma boa equipa. Um bom programa. Os activistas. A crise provocada pela direita neo-liberal. Onde falhámos?
Tenho descrito esta situação como se fossemos, o PES, uma equipa de fórmula I. Desenhámos um carro (o Partido), colocámos-lhe um bom motor (o manifesto eleitoral), umas boas rodas (os activistas), e quando foi altura de o conduzir… não só percebemos que não tínhamos condutor como parte da nossa equipa queria o piloto dos nossos adversários. Caricato, não? Depois tomámos consciência de que este não era, afinal, um jogo de equipa – onde todos vestem e suam a mesma camisola – mas antes uma espécie de entretenimento colectivo, amador, onde os jogadores da equipa se apresentam juntos no campo dos jogos com camisetas semelhantes mas todas diferentes, na core nas tonalidades. Não conseguimos transformar o potencial das nossas individualidades numa mais-valia colectiva, e fomos um qualquer conjunto de galácticos da política, equipa cheia de vedetas, incapazes de passarmos a bola uns aos outros, mais preocupados com a gestão das diversas carreiras pessoais do que em ser competitivos no campeonato da política europeia. Aí errámos. Procurámos criar e construir uma realidade europeia onde só existe dinâmica nacional. Não há 27. Há 1+1+1+1+1+1…
A noite acabou por acabar numa boa nota: a eleição – ainda por confirmar – do Rui Tavares. Éramos muito poucos os resistentes. Com interesses distintos. Curiosamente portugueses e italianos, mais e mais cabisbaixos. Os Socialistas italianos ficaram fora do Parlamento Europeu. Julgo que devemos ter uma qualquer sina para a dramaturgia trágica. Entretanto, o ruído de fundo, ritmado, do rebentar das garrafas de champanhe marcava o tempo e recordava-nos de que a festa era num outro lado. Rui, PCP ou outro do PSD. Elegemos o Rui. Podia fechar a noite com um sorriso.
Telefonei-lhe. O Rui tinha-me ligado – estava eu em Bucareste numa acção de campanha do PES – quando decidiu aceitar o 3º lugar na lista do BE. Era um dos socialistas a quem ele queria comunicar tal decisão, disse. No mínimo queria ser um dos primeiros a congratulá-lo. Telefonei-lhe. Rimos. E prometi-lhe uma cerveja pelo Parvis de Saint-Gilles e fui dormir.

4 comentários:

Vera Santana disse...

Pois é, Zé. A Europa só existe na mente colectiva de alguns. De uma élite. Dos que voam para Bruxelas e encontram a Europa no avião, dos que trabalham em Bruxelas e, ainda, de mais uns quantos seres humanos (lusos, no nosso caso) que se interessam pelas leis que Bruxelas faz.

Repara na visibilidade que não teve, em Portugal, a votação (em Maio 09) no PE, da emenda sobre os "pacotes das operadoras para a Internet". Trata-se de uma questão fundamental para uma democracia que se quer em rede, fora dos controlos partidários, estatais ou económicos.

Quem, em Portugal, seguiu a votação? Quem se interessou pelo dossier que integra a emenda? Quem aqui no rectângulo leu a Lei Hadopi (francesa)?

A grande questão é a da construção efectiva de uma cidadania europeia. Pelo exercício da mesma. Sem ela não há identidade europeia. Com isto quero dizer que cada cidadão deve, tem de estar a par das questões que estão em jogo no PE e intervir se for caso disso.

Ou construimos uma cidadania europeia no decurso dos próximos 5 anos, com muita garra, muita informação, muita formação, ou deixamos que o tempo passe, que a História caminhe, que o Erasmus (e outros instrumentos) forme lentamente uma cidadania europeia junto de gerações muito jovens capazes de vir a exercer uma cidadania europeia.

A escolha é política.

Proponho trabalho a fundo, nos próximos 5 anos. Não quero deixar o exercício da cidadania europeia para os meus descendentes. Quero que seja exercida aqui e agora.

Vera Santana disse...

Errata:

onde está

vir

leia-se

virem

Pedro Cardoso disse...

Zé,

Quem poderia ter sido o nosso condutor? O Poul Rasmunssen? O Martin Schulz? O Filipe González? O António Vitorino? Quem?

Aqui em Portugal a direcção de campanha dispensou o motor e as rodas. Pensou que o condutor nacional bastava (do género daqueles desenhos animados dos homens da idade da pedra...) :)

Diogo disse...

Uma noite em cheio! Este não pode dizer o mesmo:

Hitler ensaiou infrutiferamente obter financiamentos na blogosfera

Refugiado num bunker em Berlim, dias antes da data do seu suicídio, a 30 de Abril de 1945, Hitler é confrontado pelos seus generais com o fracasso total do seu blog, donde esperava receitas suplementares que lhe permitissem prolongar a guerra.

No auge do desespero, Hitler dispara em todas as direcções e nem sequer poupa os outros bloggers, revelando-se especialmente virulento com o Blasfémias, o Arrastão, o Causa Nossa, etc.

Vídeo legendado em português

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