. . . muito resumidamente, fala-se dos meios e das formas utilizados, com mais ou menos intensidade e frequência, para atingir fins socialmente respeitados e enaltecidos. As expectativas de mobilidade social ascendente aumentaram, felizmente, com a democracia conquistada depois de Abril de 74.
Ora, antes de 74/75, para conseguir ascender socialmente, um filho do proletariado tinha de seguir os caminhos - "tirar" um curso superior - e de cumprir as regras conviviais de cortesia e urbanidade impostos pelas classes dominantes e, ainda, de enaltecer o valor "mérito" associado à ascenção da burguesia, ou seja, passava por processos de aprendizagem mais intensivos e mais tardios do que um filho da burguesia. Dispendia mais energia e fazia-o menos precocemente que este. A mobilidade social individual era darwinista, venciam os mais fortes (ou os mais aptos...). Acrescente-se que o filho do proletário era educado dentro da família num quadro de uma moral estrita, disciplinada, frequentemente austera e ancorado no valor "trabalho", o que em muito ajudaria à interiorização de novas aprendizagens.
Ao filho da burguesia eram-lhe permitidas (nalguns casos, noutros, muito pelo contrário)mais "liberdades" e menos disciplina, porquanto o patamar social de partida era mais elevado. Muitos andaram a estudar enquanto boemiavam, não acabando - quantas vezes! - os cursos. Funcionava então o processo de "apadrinhamento" e lá se arrumava o rapaz, com curso inacabado, num banco ou numa empresa, via "cunha".
Com Abril, a generalização das expectativas de mobilidade social a um mais amplo leque de pessoas, aliada a um certo modo ocidental de olhar e de praticar liberdades burguesas - a partir de um determinado momento histórico, em nome do princípio narcisista do "prazer" nombrilista - e, ainda, conjugada com a hiper-mediatização do valor "sucesso" como finalidade social a alcançar, viria a alterar meios e modos de e para a ascenção social. Na década de 80, em Portugal, o automóvel começa a ser desejado já e agora; no século XXI, se o Pai não é rico vai-se ao BES, não importa a imprevisibilidade do pagamento das prestações; concomitantemente, o cumprimento das regras conviviais é trocado por um vazio nas trocas sociais de palavras e de gestos no quotidiano, uma vez que as formas de tratamento deixam de ser pessoalizadas ("bom dia, Senhor Joaquim", dizia-se ao entrar na mercearia) tendo-se deixado cair o tratamento pessoa a pessoa (passou a dizer-se, simplesmente "bom dia") e, mesmo este, quantas vezes é omisso!
Pode, por conseguinte, falar-se de um certo grau de "desvio social" no sentido que Merton dá ao conceito, já que, para atingir fins socialmente desejáveis - o "sucesso" - são percorridos caminhos não desejáveis mas permitidos, como o são o facilitismo nalgum Ensino Superior (e talvez mesmo no decurso do Ensino Secundário), o carreirismo nos partidos políticos (carreirismo quando se trata de subir no aparelho, ainda que as convicções sejam pouco fortes) o endividamento dos indivíduos e das famílias, a desagradabilidade no trato pessoal.
Neste cenário generalizado dos pequenos e quase surdos, porque permitidos, "desvios sociais" podem observar-se, qual tubarões a emergir no imenso mar turvo, enormes picos de grandes desviantes sociais - igualmente permitidos, até que as carecas lhes sejam postas a descoberto - como o são grupos financeiros que viveram de fraudes. E é destes que é feita a história, nos jornais, omitindo-se o pano de fundo - todos nós, ao fim e ao cabo - que somos coniventes sempre que fechamos os olhos a um diploma ou a um cargo conseguidos sem mérito ou a uma atitude de falta de cortesia para com uma pessoa, seja ela quem for. Um detalhe ínfimo: andamos todos e cada um a esquecermo-nos de tratar cada um pelo seu nome, quando enviamos emails - correio electrónico. Apesar de não ser nada difícil iniciar uma carta que vai seguir por correio electrónico por:
Maria, bom dia,
.............................
para não perdermos as pessoas, cada pessoa, na multidão, nas massas, no incógnito.
Há modos e modos de fazer. Há meios lentos e há meios rápidos para atingir fins. E, por outro lado, há media que, por definição, são rapidíssimos, como o são os emails. Bem podíamos dar-lhes um pouco da lentidão que as pessoas merecem. Tempo. E saborear o Nome do Outro, ao escrever:
M a r i a, bom dia,
............................
And the dreamers? Ah, the dreamers! They were and they are the true realists, we owe them the best ideas and the foundations of modern Europe(...). The first President of that Commission, Walter Hallstein, a German, said: "The abolition of the nation is the European idea!" - a phrase that dare today's President of the Commission, nor the current German Chancellor would speak out. And yet: this is the truth. Ulrike Guérot & Robert Menasse
segunda-feira, março 16, 2009
De que se fala quando se fala em perda de valores na sociedade actual?
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Vera Santana
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1 comentário:
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Será um tema desinteressante e sem actualidade, o que se passa nas nossas sociedades consumistas e massificadas, onde a pessoa é inexistente e facilmente substituível?
Desacordem mas comentem, please!
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