segunda-feira, setembro 18, 2006

Morangos à descrição


(se me perguntassem há uns dias, eu nunca penseara escrever sobre este assunto...)

Acabei de ver o final dos Morangos com açúcar. Tinham-me interessado como projecto, como fenómeno e como parte da nossa contemporaneidade. Admito que todo o que rodeava esta eufórica série já me tinha despertado a atenção (desde a 1ª série), mas só agora, neste verão, a acompanhei com a regularidade mínima que permita a análise. E devo dizer que me surpreendi.

Em primeiro lugar o «pacote» é muito bem explorado, de qualidade muito razoável e, com esta 4ª série, aproveita o movimento criado das últimas épocas. Depois os actores, todos muito jovens, muito magros e muito bronzeados, não estão nada mal. Tirando o ocasional canastrão (ou canastrona, lugar onde a Sandra Coias se destaca), a maioria deles safa muito bem, cumprindo os requisitos do muito aceitável, não destoando de quaisquer 90210 ou OC (séries americanas de jovens) que por aí andem. A história falha um pouco, muito baseada em clichés fáceis e nada inovadora ou reflexiva (a tentativa do tema gay na relação entre duas personagens – desculpem mas não sei os nomes – foi o mais ousado tentado, e aí o segundo «homem» era afinal uma «mulher» disfarçada…). Nada de sexo, preservativos, abortos, relações com os pais (aliás, não há país na série, tirando os que com 35 anos nunca trabalham e tem sempre todo o tempo para os filhos, e a personagem da Rute Marques – dela sei o nome), doenças, droga, dinheiro, trabalho, dificuldades, universidade (mais de metade deles acabaram o 12º ano, mas muito pouco se discutiu o futuro universitário), desemprego, globalização, heterogeneidade cultural (todos brancos, de preferência com olhos de cor, magros, portugueses), racismo, Europa, pedofilia, etc. Muito pouco imaginativo, o argumento. Uma praia sem um estrangeiro em Portugal? Não pensava existir. (foi ver o site, afinal havia uma grávida adolescente…)

O aproveitamento próprio é evidente. A quantidade de top 10 que a série já produziu, na discografia nacional recente, impressiona. D’zrt, FF, Patrícia Cardoso, 4 Taste, entre outros, transbordaram da série para os palcos nacionais. Das séries já sairam peças de teatro (da 1ª série), e inclusive varios livros de diversos protagonistas (da 2ª série - "Sociedade Secreta" de Inês Gomes, Pedro Lopes e Sara Rodrigues, "Confissões de Ana Luísa" de Sara Rodrigues, "Mistério no Motocross" de Pedro Lopes e Vasco Domingos e "Viagem Inesperada" de Elizabete Moreira e Lígia Dias; da 3ª série - "Sonho do Trapézio" de Mafalda Ferreira e Catarina Dias, "Ao som do Hip Hop" de Elizabete Moreira, Ligia Dias e Sandra Santos, "Epicentro nos Açores" de Sara Rodrigues e Vasco Domingos, "Último Versículo" de Sara Rodrigues e Vasco Domigos, "Corpo de Verão" de António Bandeira Elizabete Moreira e Pedro Lopes. Não se brinca aqui. Tudo é muito bem pensado e calculado. Há, como em tudo o que envolve entretenimento, algum risco. Mas muito calculado.
É muito interessante ver o duplo conceito de «concerto/gravação de episódio) que a TVI já por diversas vezes ensaiou (como o «episodio do Coliseu dos Recreios», muito bom por sinal, que terminava a 3ª [?] série). Sem falar na colocação de «novos actores» noutros projectos da casa. À TVI só falta «cruzar» séries para se aproximar do que de melhor se faz lá fora (em termos de aproveitamentos de recursos televisivos, da interdisciplina artística e da penetração simultânea de marcados de formatos diferenciados).

É também muito interessante ver a recentemente criada industria porno light aproveitar os corpos das jovens wannabe actrices nas revistas da especialidade (Maxmem, FHM e outras). Aliás, na série só se vêm meninas de bikini (só) e meninos sem t-shirt. Curiosamente, quando foi presa a personagem «Mónica», na prisão feminina as presidiárias eram todas fortes e bem mais velhas (como quem diz, se fores má…).

Resumindo, não espero com alguma ansiedade a nova série (muito pelo contrário), vejo na Floribella um fenómeno não bem igual (o público alvo é ligeiramente mais novo-não-de-secundário) mas com parecenças óbvias e objectivo final igual – a conquista do share televisivo, das classes AB e de miúdos e jovens facilmente, com tempo livre, pouca imaginação e dinheiro dos pais para gastar.

Faz tudo parte do grande centrão que estamos a criar (ou a recriar, uma vez que já existe?). Ou não?

2 comentários:

Unknown disse...

Industria Porno Light? O que é que chamas ao segmento de revistas com nús? E à página 2 da revista do Correio da Manhã do final dos anos 80?

José Reis Santos disse...

Tens razão, meu amigo, mas parece-me que agora há uma panóplia de revistas e afins que se dedicam, na quase exclusividade, à exploração do binomio carros-gajas.(ver, a esse exemplo, a última revista promovida pelo jornal desportivo «O Jogo»).
Resumindo, não digo que não existam exemplos tabloidizados (genero página 3 do «The Sun») ou esporádicos durante os anos 80 ou mesmo antes. O que me parece é que nem esses exemplos fazem uma industria nem a quantidade de titulos hoje disponivel se compara com a do passado.
Digo mesmo mais, hoje essa industria é um dos vértices do mundo do espectáculo/entretenhimento nacional (internacionalmente esta relação está há muito sustentada).

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